A benigna inquisição espanhola

Ok, o título é provocativo. A Inquisição Espanhola cometeu e permitiu muitas injustiças contra cristãos de origem judaica na Espanha. Mas você sabia que ela era atribuição da Coroa espanhola, e que o próprio Papa pediu que ela abrandasse seu tratamento dos réus, o que lhe rendeu uma resposta do Rei Filipe insinuando que estivesse em conluio com os conversos? Que depois de algumas reformas ela se tornou muito mais leniente do que qualquer tribunal secular da Europa? Que ela impediu as caças às bruxas na Espanha que tomaram conta do resto do continente? Que usou tortura em apenas 2% dos casos, que o tempo máximo da tortura era de 15 minutos e que ela raramente era aplicada duas vezes e nunca, em hipótese alguma, uma terceira vez? E que em 350 anos condenou 4.000 pessoas à fogueira (compare isso com a Revolução Francesa, que em cinco anos matou cerca de 40.000)?

Pois é, há fontes mais confiáveis do que Monty Python e Mel Brooks. Este artigo de Thomas F. Madden, que consultou pessoalmente os arquivos (bastante extensos) da Inquisição na Espanha, foi publicado originalmente em 2003 (e republicado agora pelo site linkado) e dá um ótimo panorama histórico da Inquisição e contesta vários mitos. Nada disso justifica ou desculpa crime algum, muito menos algo grave como tortura ou execução devido a crença religiosa de uma pessoa sequer. Colocar os fatos em sua devida proporção, contudo, é uma questão de justiça.

21 comentários em “A benigna inquisição espanhola

  1. O livro clássico sobre a Inquisição espanhola é do Henry Kamen, que é o leading historian na Espanha do siglo de oro.

  2. Tem toda essa onda revisionista entre historiadores, que para o bem ou para o mal, traz grandes contribuições para discussão e construção do nosso entendimento sobre eventos passado. Mas começo a desconfiar já pelo título do artigo “The Truth about the Spanish Inquisition”.

    “E que em 350 anos condenou 4.000 pessoas à fogueira (compare isso com a Revolução Francesa, que em cinco anos matou cerca de 40.000)?”

    Sejamos um pouco racionais, come on!

  3. Henrique, mais racionais como os revolucionários guilhotinadores franceses?

    Não entendi o que há de *irracional* na frase que você citou.

    []’s

  4. Hoje, em geral, as pessoas têm um entendimento marxista da Revolução Francesa, como um mero movimento político contra a injustiça social e econômica, uma mera “Revolução Burguesa”. Mas não era este o entendimento dos protagonistas dessa revolução. Para eles era um movimento pela Liberdade, Igualdade e Fraternidade (importante: tudo em maiúsculas), e claro, todas as ações eram guiadas pela Razão (maiúscula, maiúscula!). Se alguém lhes explicasse que eram apenas burgueses com interesses econômicos, provavelmente iria para a guilhotina. Era um movimento, sob muitos aspectos, religioso. E uma prova disso é que se criaram muitos cultos à Deusa Razão.
    Muito racionalmente, de forma fraterna e respeitando a liberdade eles mataram, após julgamentos sumários, o quanto mataram. Não estamos falando de mortes em batalha, mas de capturas e serenos enfileiramentos diante da guilhotina. A comparação numérica com a Inquisição é bem pertinente e racional, afinal a maior parte do que a Inquisição julgava já era considerado crime pela justiça secular (religião, naquela época, não era uma mera questão de opinião, como hoje, mas de ordem pública). Além disso, o objetivo era redimir o acusado: após a confissão e arrependimento muitos réus eram liberados, o que jamais poderia acontecer na justiça secular. Até hoje.

  5. Muito se fala da tortura para condenar a Inquisição. A tortura era prática corriqueira da justiça secular, sem regras ou limites. A Inquisição impôs regras e limites. Com o nosso olhar cronocêntrico, só conseguimos interpretar a tortura como simples sadismo,crueldade, pura maldade. Mas ela era prática comum e oficial na época não porque as pessoas eram sádicas e hoje evoluíram. É preciso ter em mente que na época não havia anestésicos. Toda pessoa adulta de qualquer classe social já tinha tido alguns dentes arrancados a sangue frio (hoje isso é técnica de tortura). A maioris já tinha presencciado algum ente querido ter um membro amputado a sangue frio. É óbvio que o olhar que a gente daquele tempo tinha para com o sofrimento alheio era muito diferente e muito menos sentimental do padrão atual. Todas as pessoas já tinham passado por dores semelhantes às inflingidas nas sessões de tortura. É fácil imaginar uma pessoa daquela época pensando “- Se eu que nunca fiz nada de errado já passei por estas dores, porque este herege, que com suas práticas pode acabar com a nossa lavoura e nos matar de fome, não merece passar também?”

  6. Havia abusos? Claro que sim. Mas se “abusos” são válidos para condenar algo, então tem de ser a humanidade inteira com TODAS as suas instituições. Os abusos não são o que diferenciam a Inquisição das demais instituições, mas outras coisas; algumas citadas acima.

  7. Boa colocação em relação a tortura Rodrigo, é isso mesmo.
    Não tenho teho qualquer restrição quanto a esse tipo de abordagem, que acho até muito saudavél e justa (“Colocar os fatos em sua devida proporção, contudo, é uma questão de justiça.”, como disse o Joel), só me preocupa, às vezes, a maneira como são ‘utilizados’ certos estudos como o do Madden.

    E não acho necessária a comparação sobre quem matou mais ou deixou de matar, enfim.

    E sobre a Revolução Francesa, vejam o trabalho do François Furet, também revisionista.

  8. A inquisição espanhola, além de toda a baixaria inerente, significou também uma intervenção do governo nos assuntos privados.

    Como chamá-la de benigna???

  9. Se matou menos do que outras causas então era benigna? Tá bom, então.
    O maluco e fanático religioso que matou as crianças em Realengo era benigno também? Afinal, foram somente doze…

  10. Estava demorando para aparecer alguém para imputar às “religiões” o crime do perturbado.

    A intenção do autor era a que há na expressão “tumor benigno”. Causa danos, mas que bom que não é “maligno”.

    Não é o que penso sobre a Inquisição. Para mim, o estado é uma coisa boa se usada responsavelmente, pois garante a ordem. Abusos ocorrem, naturalmente. A Inquisição entendo como coisa boa.
    Imagino se daqui a 200 anos sairá uma revista de divulgação da ciência histórica com a chamada: “O Estado democrático: como era o reino da mentira e do terror homicida”

  11. Eu não imputei à religião a culpa pelos crimes do maluco de Realengo. Apenas quis fazer um paralelo com a benignidade da Inquisição Espanhola, pelo fato de ele ter matado “apenas” doze pessoas (até o momento). Perto de Kaddafi ou Saddam Hussein, por exemplo, ele seria considerado benigno, então?
    Mas voltando à Inquisição, muito curiosa essa ideia de que “abusos ocorrem, naturalmente”. Era a mesma lógica do comunismo stalinista.

  12. Ricardo,
    O maluco de Realengo seria considerado “benigno” apenas ironicamente, caso um outro maluco afirmasse que ele é tão ou mais “maligno” do que Kaddafi ou Saddam. É claro que ele (o de Realengo) não é. E para rebater a comparação absurda, pode-se retoricamente, usar um outro absurdo. A palavra “benigna” foi usada, desde o início, ironicamente para chamar a atenção dos exageros, distorções e contextos omitidos sempre que se aborda o tema Inquisição.
    Quando um comunista imbecil elogia o stalinismo (20 milhões de mortes) e condena a ditadura militar brasileira (400 mortes), é perfeitamente cabível, em nível retórico, dizer que a ditadura brasileira foi benigna – a chamada “ditabranda”. Entendeu agora? Consegue perceber também como a comparação numérica é absolutamente pertinente?

  13. Quanto aos abusos, vocês os está confundindo com “norma”, quando são desvios. O que se condena no Stalinismo é a norma, não os desvios. Os expurgos de Stalin não foram desvios. Os Gulags não foram desvios. Holodomor não foi desvio. As cotas emitidas pelo Politburo não foram desvios.
    O extermínio de judeus pelos nazistas foi um desvio?
    A Inquisição foi o único tribunal na história da humanidade que liberou culpados mediante confissão e arrependimento. Esta era uma norma, quem não a seguiu, cometeu abuso. A Inquisição criou regras e limites para a tortura (com a recomendação de que deveria sempre ser evitada). Esta era a norma, quem não a seguiu, cometeu abuso.

  14. Existe meio mal???? a inquisição FOI SIM UM GRANDE MAL PROPORCIONADO PELA IGREJA E OS REIS DA ÉPOCA, PONTO FINAL, se torturou ou matou menos não DIMUNUI O CRIME. ponto final.

  15. 4000 pessoas em 350 anos. (é mais ou menos, 11 pessoas por ano.)
    4000 pessoas o ateu Mao Tsé-tung matou em uma bela manha de sol. haha (o ateu Mao Tsé-tung matou 70 milhoes de pessoas no seculo passado.)

  16. Se compararmos todos os assassinatos que ocorrem no Brasil como os do grupo de extemínio da Baixada, pô então os exterminadores no fundo devam ser até boas pessoas, boa essa tese, vou passar a seguí-los.

  17. A inquisição cometeu torturas? isso é chover no molhado. Mas o é rever e concluir que tal chuva não foi uma tempestade como sempre pintou os historiados cobras-criadas do Iluminismo. Mostrar a Idade Média como idade das trevas e a Inquisição como seu símbolo foi uma estratégia ideológica para se mitigar ou ocultar a escuridão trazida pelo iluminismo e a violência praticada em várias revoluções. Imaginem quantas pessoas não estariam vivas se os revolucionários franceses, Lênin, Stalin, Hitles, Mao, Pol Pot, Castro etc tivessem agindo segundo o padrão da inquisição? Mas, em nome da Revolução, da Democracia, do Direito, do Povo, eliminaram, sem nenhum julgamento com direito a defesa ou arrependimento, milhões e milhões de pessoas. Leiam a obra do prof. João Bernadino Gonzada: A Inquisição em seu Mundo.

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado Campos obrigatórios são marcados *

Você pode usar estas tags e atributos de HTML: <a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <s> <strike> <strong>