A Cultura do Ministério

Ao olhar os cadernos de cultura e os recentes manifestos sobre a saída de Ana de Hollanda do MinC, me vi forçado a explicar para um amigo de passagem pelo Brasil as atribuições de um Ministério do setor. Foi uma tarefa desagradável pois acho que, de alguma maneira, ele saiu com a idéia que nosso país deva sua pujança cultural – extraordinária e incontestável – a burocratas de Brasília.

Após nosso papo, o gringo entendeu ao menos o porquê do selo do governo federal a estampar a comunicação de todas as ações, eventos ou instituições culturais a que assistiu. E ponderou, com alguma razão, que hoje somos todos, artistas e agitadores culturais, de alguma forma, mantidos pelo governo. Somos, à nossa maneira, lépidos dependentes a viver das tetas da estrutura burocrática. Ele se divertiu, é claro, com minha observação de que algumas ações – guerrilheiras! contra-culturais! – resistiam bravamente à tal chancela: são elas – revolucionárias! -, a televisão, os jornais e revistas, as salas de cinema, as livrarias e algumas editoras; a cultura vive ali pela força mesma de sua atuação e relevância, não pela sinecura estatal.

Mas nem sempre foi assim. Se alguém quiser saber a importância de um órgão oficial de cultura para a cultura nacional, basta olhar o “estado das artes”, literalmente, antes do surgimento do ministério. O MinC foi criado apenas em 1985, no governo do presidente José Sarney e, até então, as ações culturais “oficiais” eram tratadas em conjunto com a educação, pelo Ministério da Educação e Cultura (que faz o dito ser reconhecido até hoje como MEC). Eram em sua maior parte, ajudas pontuais – financiamento para fechamento dos gastos de uma temporada de concertos aqui, um show fechado para artista militante ali, e cosí via. A cultura vivia “extra-oficialmente” com espetáculos que se financiavam com a receita da bilheteria, turnês que rendiam dinheiro ou levavam produtores à falência… Hoje parece loucura imaginar algo do gênero.

O Cinema era um caso específico, tinha uma fomentadora especial – a Embrafilmes – e arrisco dizer que por isso a sétima arte no país nunca tenha decolado. Pois existe algo saudável no livre mercado dos produtos culturais: os espetáculos valem o quanto valem (tautologia besta mas se não fosse a subvenção estatal, assumindo para si o risco do encalhe, qual evento se daria ao luxo de cobrar 1.400 reais a entrada?); ou, o público não precisa ser VIP da FUNARTE para assistir um evento.

O que não expliquei a meu amigo: longe de regular tais disfunções, o Ministério as provoca. É que apenas seguindo as regras mais primárias das transações econômicas – a lei da oferta e procura, por exemplo – um artista poderia criar sem enclausurar-se no próprio umbigo. Seguindo tais regras o criador de eventos e espetáculos passa a ser relevante, pois guiado por um juiz implacável que é o seu público. Por preconceito pensamos que o público gosta de baixaria, BBBs e outras bobagens – gosta também, mas o mau gosto em qualquer programação cultural tem mais a ver com falta de coragem dos curadores do que com a real expectativa do público. Shakespeare fazia o que fazia com vistas aos pagantes do Globe Theater; e assim, para suas respectivas platéias, Mozart, Haydn, Verdi e Chaplin. Na televisão, “O Cordel Encantado” ou “O Castelo Rá-Tim-Bum” foram, cada qual em seu nicho, evidentes sucessos.

O público não é idiota e não deveriam ser idiotas os curadores, criadores, artistas e que tais que agitam a cultura nacional. O Ministério, desde muito antes de Ana de Hollanda, tende a tratar tais agentes como se vivessem de fraldas, a dar mamadeiras em forma de sinecuras, editais e subvenções outras. Com sua visão antropológica da cultura, ao invés de solicitar iniciativas que façam o Brasil participar da grande conversação, que é exatamente aquela da cultura humanista, fica a fomentar guetos idiossincráticos. Sobre nada disso se dá a discussão da saída ou resistência da ministra.

Um comentário em “A Cultura do Ministério

  1. A Ana de Hollanda assim como qualquer um que ocupou ou que vai ocupar este cargo já vai tarde ! Não há mais cultura alguma neste país que esteja livrer das categorias do Marxismo e da Psicanálise. Aliás, se for uma mistura dos dois como quer Marcuse, melhor ainda. O fato de ser abençoado (com verba ou sem) pelo Ministério da Cultura não faz mais diferença alguma. Nossa cultura foi destruída pela geração de 68 e ainda não há nada para ser colocado no lugar. Muito bem fez o Glauber Rocha, que antes de morrer (mesmo tendo sido comunista) debochou desta esquerda burra e corrupta e recebeu o general Figueiredo em Portugal !

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