A política de Mario Vargas Llosa

Sim, este correspondente que vos escreve esteve em Porto Alegre na semana passada e passou três dias ao lado de Mario Vargas Llosa, Prêmio Nobel de Literatura 2010. Sim, vocês saberão mais sobre isso na próxima Dicta&Contradicta, aguardem. E, sim, o sujeito é uma simpatia, um escritor digno de figurar como exemplo de intelectual público – algo que não temos desde a morte de Albert Camus (aliás, uma de suas grandes influências).

Enquanto isso, no mundo internacional, todos elogiaram a Academia Sueca pela escolha do prêmio porque, afinal, Llosa é um grande contador de histórias. Contudo, como aponta a Spike, algumas pessoas na Suécia (tinha de ser…) resolveram reclamar porque o importante não era a literatura e sim a tal da política “neoliberal” do escritor peruano.

No Brasil, o único país do mundo onde o feto é transformado em discussão política e “neoliberal” é equivalente a xingar a senhora sua mãe, esta é uma espécie de discussão que sempre volta à baila toda vez que alguém resolve enfiar o assunto das “privatizações” goela abaixo. Felizmente, Llosa foi recepcionado em Porto Alegre com palmas, aplausos e ovações unânimes que, neste caso, provam que talvez Nelson Rodrigues esteja errado.

Mas como no FEBEAPÁ tudo deve ser explicado – afinal, existem pessoas que reclamaram de Tropa de Elite 2, o filme mais didático do mundo, alegando que a narração em off prejudicava a sua qualidade artística – creio que é necessário ler este artigo do Washington Post que destrincha a complexidade política das posições de Llosa, analisando suas nuances e respeitando o fato de que, apesar de eventuais falhas – um agnosticismo que o impede de compreender corretamente o que é a experiência religiosa e um amor pelo liberalismo econômico que o faz confundir entre a liberdade exterior e a liberdade interior -, mostra que ele foi sempre um intelectual inclassificável e sobretudo corajoso no momento de definir as suas idéias.

(Ah, claro, e quem quiser ler mais sobre os romances e os ensaios de Mario Vargas Llosa, além de ter acesso às fotos familiares do Nobel em suas andanças por Madri, Londres e Nova York, não percam este fabuloso dossiê que o El País fez para homenagear o laureado.)

13 comentários em “A política de Mario Vargas Llosa

  1. Acabo de descobrir uma falha na minha personalidade, então: “um agnosticismo que o impede de compreender corretamente o que é a experiência religiosa e um amor pelo liberalismo econômico que o faz confundir entre a liberdade exterior e a liberdade interior”. Llosa é grande.

    O livro autografado é o Orgia Perpétua?

  2. Ô Martim,

    Bom saber que esse teu encontro com o Mário será melhor descrito na nova Dicta…

    Só uma dúvida, Martim, se me permite a ousadia: Entendi o sentido em que v. usou o “destrincha”, mas, no caso, não seria correto destrinça?

  3. Caro Miguel,

    Houaiss e Aurélio consideram “destrinchar” como brasileirismo de “destrinçar”. Mas ao furo e à medida que já é forma mais que estabilizada em português, não há porque recriminar “destrinchar”.

  4. Entendi, meu caro Martim… Desculpe-me a provocação…rsrs… O intuito foi só de fazer graça pro mestre que admiro…Longe de mim querer ensinar o pai-nosso pro vigário…rsrs…
    É que sigo mais o Luiz Antônio Sacconi, o qual, além de ainda estar vivo — talvez seja nosso único dicionarista vivo — defende formas mais “puristas” (e que eu acho mais elegantes). Ele considera destrinchar brasileirismo criado por influência de “trinchar”, forma que, sempre segundo ele, em rigor deve ser vista como corruptela e, como tal, evitada.
    Abraços antecedidos de vênia comovida pela atenção que você dedicou a este pobre marquês.

  5. Desde quando agnosticismo virou falha de personalidade? Se eu dissesse que cristianismo é uma falha de personalidade (hipoteticamente, bem entendido!) seria crucificado (desculpe o tracadilho) aqui neste espaço.

  6. “Se eu dissesse que cristianismo é uma falha de personalidade (hipoteticamente, bem entendido!) seria crucificado (desculpe o tracadilho) aqui neste espaço.”

    Ué, e com total razão!

  7. Ricardo, reclamar do porquê um opinador não faz um julgamento simétrico para os dois lados, seja qual for a disputa, não é good cricket. Afinal, como opinador ou debatedor ou o que for, o Martim se posiciona, i.e. não é um mediador.

    E se, na verdade, você estava comentando sobre o bias da publicação como um todo, bom . . . acho que vale dizer a mesma coisa. Você notou que você é livre para comentar aqui, não?

  8. João Carlos

    Eu gosto de ler os post da Dicta. O meu problema é que fico muito preso a esta definição, que está lá em cima, no link “Sobre a revista”:

    “Reúne artigos e resenhas de intelectuais brasileiros e estrangeiros sobre os grandes temas da cultura ocidental: a ética, a filosofia, a literatura e as artes, sob uma perspectiva de longo prazo, desvinculada da política partidária e com uma vocação, na medida do possível, universal.”

    Eu sempre me esqueço do “na medida do possível”. Vou procurar me lembrar deste detalhe antes de fazer qualquer comentário futuro.

  9. A mim, “destrinchar” incomoda-me menos – na verdade não incomoda – do que certos anglicismos, perdoem-me a franqueza, pedantes. “Bias”? Fala que nem gente, pô!

  10. Concordo com Henrique Garcia. Alguns anglicismos já estão totalmente incorporados à linguagem cotidiana, nós nem percebemos. Mas outros soam meio “forçados” mesmo, chega a doer no ouvido.

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado Campos obrigatórios são marcados *

Você pode usar estas tags e atributos de HTML: <a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <s> <strike> <strong>