Nas disputas intelectuais entre ateísmo e religião, é incomum ouvir a voz do Judaísmo. Pois aqui está ela: num discurso incisivo, o rabino chefe do Commonwealth britânico lida com as principais questões que confrontam a religião: por que ela sobrevive até hoje, tendo sua morte sido prevista tantas vezes no passado, ao menos desde o século XVIII? Qual o lugar dela nas democracias liberais? E qual deve ser sua postura no futuro?
Homem bem versado na cultura ocidental, e que no passado já foi um estudante de filosofia cético, Jonathan Sacks aponta os paralelos entre a cultura ocidental contemporânea e a cultura grega em seu período de declínio. Políbio comentava no século III a. C., sobre seus conterrâneos: “O fato é que o povo de Hellas seguiu pelo caminho falso da ostentação, da avareza e da preguiça, e ficaram, portanto, indispostos a se casar, ou, se se casavam, a criar os filhos; a maioria estava apenas disposta a criar um ou dois.” É, algum paralelo há.
No final das contas, argumenta o rabino, só a religião dá significado à vida humana. O mercado, o Estado, a ciência e mesmo a filosofia são incapazes de cumprir esse papel. E o homem anseia por significado. É por isso que, mais de dois séculos depois do Iluminismo, editores da The Economist escrevem um livro notando o fato surpreendente (que também surpreendera Tocqueville em suas viagens à América) que “God is back”.
O Judaísmo sempre foi parte da cultura ocidental, mas uma parte à parte: tem suas peculiaridades e traços distintos da cultura cristã. São esses toques (por exemplo – novamente reproduzindo o que diz Sacks – a teologia, que nunca foi muito dependente da metafísica aristotélica, e que portanto não se sente diretamente abalada quando a teoria da seleção natural questiona a idéia de finalidade na natureza; ou ainda a observação de que, para um rabino, é muito mais difícil pregar para judeus do que para gentios, algo que já ocorrera com os profetas) que dão ao artigo um interesse especial, para além da argumentação central do autor, bem embasada em fontes históricas, lúcida e lógica.
E aqui um pequeno artigo de comentário sobre o discurso, que faz uma boa síntese dele.
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Ainda não abri o que foi linkado (coloquei no backlog), mas gostei muito dessa formulação do post sobre a “parte à parte”, etc. É por aí. Meio fora do tema do post, numa via conexa e de acesso difícil, vale recordar que a praga do anti-semitismo disfarçado de profissão de fé cristã (“povo deicida”, usw) continua a fazer estragos. Na direção contrária, evidentemente, daquilo que notou João Paulo II: “encontrar o Cristo é encontrar o judaísmo.” Serviço internacional de documentação judeu-cristã em francês, inglês e italiano: http://www.sidic.org/fr/default.asp
Com a devida licença por me distanciar um pouco do texto do Joel, segue link para reflexão (em francês) em torno da Lei judaica, a Torá, tão mal compreendida em vários circuitos culturalmente cristãos: http://www.sidic.org/fr/reviewViewArticolo.asp?id=192