Ano Novo

No texto passado falei do Natal, festa cheia de significados, tanto religioso como laico, que corre o risco de se esvaziar. Já o Ano Novo é uma festa, a primeira vista, sem significado; a celebração pela celebração, com uma data arbitrária pra servir de pretexto. Cumpre que encontremos seu significado, se é que ele existe.

O que comemoramos duas noites atrás? A passagem do ano. O tempo que continua passando como sempre passa. Ou seja: a volta da Terra a um ponto arbitrariamente escolhido em sua órbita do Sol. O Ano Novo, aliás, nem sempre foi em 1 de janeiro. Na Inglaterra e colônias era celebrado, até meados do século XVIII, em 25 de março.

Talvez o melhor símbolo da festa sejam os fogos de artifício: uma beleza exuberante, brilhante, que dura poucos segundos e se apaga, como a alegria fugaz das pessoas a festejar a passagem de um dia e a determinação igualmente ilusória de grande mudanças para o ano que se inicia.

Ou estarei talvez sendo cínico demais? Pois imaginemos um mundo sem Ano Novo. Um mundo em que fosse mês após mês após mês, sem nunca fechar um ciclo maior. Ou ainda semana após semana, ou dia após dia. Estamos no dia 734017 d.C. (valor aproximado), amanhã será o dia 734018 d.C., e continuamos assim, sem respiro, sem nenhum horizonte de prazo mais longo para descansar a vista. Um pouquinho opressivo, não é?

O tempo é linear, mas o homem precisa que essa linha seja composta de ciclos que dêem à sua vida rotinas, prazos e metas, como cenouras à frente dos cavalos para que eles sigam sempre em frente. Felizmente, calhou de que o ciclo de translação da Terra ocorra num período bem adequado à vida humana: longo o bastante para que nos permita fazer planos e não se banalize, mas não longo demais, que nos levaria ao desespero. Providência? Evolução? Ambos, talvez. O fato é que o homem, que é o que há de mais valioso no universo, demanda marcos de passagem, e que o ano constitui, por sua natureza, uma unidade muito importante na vida humana, devido aos ciclos sazonais. Sim, o ponto que escolhemos é arbitrário, mas o ciclo que ele celebra não é. Sendo assim, o Ano Novo é uma celebração da humanidade, ou melhor, do que a humanidade poderia ser; e daí os propósitos de fim-de-ano.

Comemoremos, então o Ano Novo, e que nossos desejos de melhora para esse novo ciclo não tenham duração tão curta quanto os fogos de artifício e o gás da champanhe.

Feliz 2012 a todos!

2 comentários em “Ano Novo

  1. Tenho gostado bastante dos textos postados por aqui, e posso dizer que a dicta&contradicta tem me feito pensar bastante, rever conceitos, alem de me manter informado sobre assuntos que de fato não são tratados de maneira profunda no meio editorial, digamos mainstream. Joel, seus textos são muito bons, principalmente pelo poder de concisão.

    Abraço, e feliz ano novo para o pessoal da dicta.

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