Apenas letal

“O homem é apenas um punhado de moléculas” – diz, com sorriso maroto, o materialista iconoclasta. Tudo o que você conhece e gosta – seus ideais, seus sonhos, sua namorada, o carinho da mamãe, tudo – é ilusório. Os cientistas comprovaram: a realidade é composta de moléculas. Não há Deus.  No entanto, o que torna a afirmação tão perigosa não é a ciência, e sim o uso espertinho da gramática.
É verdade, o homem é (no sentido de “é composto de”) um punhado de moléculas. Até aí, não conheço ninguém que discordaria. O veneno está invisível, escondido na singela expressão “apenas”. “Eu queria apenas me divertir!”; “Foi apenas uma vez!”; “o homem é apenas um punhado de moléculas”. Com apenas uma palavra, todas as esferas da realidade menos uma são eliminadas. Contudo, não nos deixemos levar: o “apenas” é apenas uma manobra retórica, e não um motivo racional para restringir nosso pensamento à esfera querida por nosso interlocutor.

Uma casa é uma pilha de tijolos, mas não é apenas uma pilha de tijolos. Não acredita em mim? Vá aos fundos de uma olaria; lá haverá muitas pilhas de tijolos, mas nenhuma casa. A definição dada responde à causa material, à pergunta “do que é feito?”, mas é apenas uma parte da resposta à pergunta mais ampla “o que é?”. Faltou o mais essencial: uma casa é definida, antes de tudo, não pelos materiais que a compõem (embora também por eles), mas por seu projeto: ela é dividida em cômodos, cada um com sua função no todo cujo fim último é abrigar e permitir a vida de uma pessoa ou grupo delas. E o que é esse projeto? Ele está desenhado num papel, na planta, mas ele não é o desenho. Tanto é assim que é possível desenhar o mesmo projeto em outro papel com outro lápis, e nem por isso a casa terá dois projetos. O projeto é aquilo que o desenho expressa: a estrutura lógica, racional, da construção: os tamanhos e localizações dos cômodos, onde cada material será usado, a função de cada cômodo, etc.

É o projeto da casa, a estrutura lógica que ordena o todo, que a metafísica tradicional chamava de “forma”. A forma não é uma entidade paralela ao ser real; o projeto asbtrato e a casa física não existem separadamente. Tijolos sem projeto, e projeto sem tijolos, não seriam uma casa.

A filosofia incorreu num grande erro quando aceitou a distinção radical que Descartes fez entre corpo (“coisa extensa”) e mente (“coisa pensante”). É simplesmente impossível bolar uma teoria que explique satisfatoriamente como duas coisas radical e categoricamente diferentes podem influenciar uma a outra (a resposta de Descartes, a glândula pineal, era claramente o ponto mais fraco de seu pensamento). Assim, de duas uma: ou o corpo engoliu a mente (materialistas), ou a mente engoliu o corpo (idealistas).

A única saída disso é negar de saída o dualismo cartesiano, segundo o qual corpo e mente seriam duas substâncias distintas (isto é, entidades que existem por si mesmas). Antes, a relação entre os dois é aquela que existe entre matéria (do que algo é feito) e forma (o que algo é). É impossível entender um ser vivo sem falar de funções (alimentação, crescimento, reprodução, etc), algo que evidentemente não está dado nos componentes materiais (moléculas) de que ele é feito. A alma é o princípio ordenador pelo qual o ser desempenha todas aquelas operações próprias do ser vivo; é como o projeto da casa, mas que determina não apenas uma extensão espacial estática, mas todo um jeito de se comportar e todas as capacidades que o ser vivo pode desenvolver. O que chamamos de mente é uma das funções da alma, que depende, para funcionar, do corpo (dos sentidos, da memória, etc), mas não é o corpo.

Isso significa abrir mão da imagem sedimentada na nossa imaginação coletiva, e inegavelmente útil: a do corpo como morada da alma, que o guia assim como um motorista guia um carro. Por serem entidades de categorias radicalmente diferentes, é impossível traçar qualquer relação inteligível entre corpo e alma no modelo dualista. Como pode, a alma, entidade não-física, ter efeitos físicos? E como pode o corpo, pura matéria, mexer com o espírito? Reduzir o homem, ou qualquer ser vivo, ou qualquer ser, a apenas matéria ou forma é fechar-se a uma parte limitada e em si mesma ininteligível, da realidade, é apenas mutilar a própria inteligência.

20 comentários em “Apenas letal

  1. Salve, Joel. 1) Woody Allen sustenta que a melhor das dietas seria a cartesiana, mais ou menos assim: enquanto sua res cogitans alimenta-se com a leitura da Dicta ou do Discurso do Método, sua res extensa farta-se de bolinhos de bacalhau e pastéis de nata, sem problemas de colesterol, etc, caso a glândula funcione bem. 2) Você puxou uma conversa comprida, que “inter alia” tem a ver com o abismo a escancarar-se ali no século XVII entre as novíssimas físicas matematizadas e a teologia; mas tentando encurtar: quando lembramos de R. Descartes, é freqüente recordarmos também de B. Pascal. Ambos tentaram se haver como cristãos com o que já foi chamado (por Alexandre Koyré) de “destruição do cosmos” e “geometrização do espaço” que, no período barroco (ok, clássico na França), mudava radicalmente o que você chama de imaginário coletivo sobre o universo e a pessoa humana. 3) Hans Urs von Balthasar sugere à reflexão um esboço de contraste esclarecedor entre RD e BP, ambos tão excelentes matemáticos. Aproximadamente: a) Descartes é um marco na história da filosofia também por enganchá-la numa razão “dependente do ideal científico” tal como formulado no campo das ciências naturais então emergentes. Seu método “geométrico” aplicado à metafísica tende a dissociar completamente filosofia e teologia, que até o Renascimento mais ou menos ainda respiravam juntas. b) Pascal alinha-se numa tradição que remonta a Santo Agostinho e passa por São Bernardo: sua muito abusada referência ao “coração” tem mais a ver com o desejo de ressaltar o lugar da pessoa, da pessoa no universo “dos espaços infinitos” mais do que de seus afetos nesses espaços. Longe de opor coração e intelecto, o primeiro fundamenta o segundo. Cabe lembrar do “pondus amoris” agostiniano: o amor, que em última análise remete sempre a Deus (mesmo quando perversamente equivocado nos meios para alcançá-lo) tem um “peso” que arrasta nossas idéias e as associa a nossos desejos pessoais. 4) São claras as conseqüências destes “senderos que se bifurcan”, assim caricaturalmente associados a RD e a BP: a) na senda cartesiana (e será que Descartes queria isso, ele que sempre fez profissão de fé católica?) andam tantos dos que só vêem incompatibilidade entre fé e razão, desconhecem como a primeira pode coroar a segunda e tratam o conhecimento de maneira instrumental, em registro “apenas” imanente. Algo que chega ao paroxismo em nossos dias: sei de um professor inglês brincando com a idéia de que mais cedo ou mais tarde suas pesquisas tomistas serão avaliadas do ponto de vista de como contribuem para a produção de leite, digamos. No joke: o espaço acadêmico para certos saberes liberais vai se estreitando em muitos lugares. Sempre esquematicamente, subordina-se a razão à vontade. E vontade de um poder que, se bobearmos, resvala para o manipulatório em larga escala. b) No caminho de Pascal andam aqueles que, a seu exemplo, não querem “reduzir o homem” (a pessoa humana); vinculam a vontade à razão “do coração” e tratam o conhecimento numa vertente, hm, newmaniana; cf o texto de Julio Lemos linkado aí em cima na D&C número 1: é “evidente que ´conhecer é poder´, mas antes de mais nada conhecer é um bem. Esse bem pode ser instrumentalizado por uma ars servilis e produzir um fruto tangível; mas também pode voltar-se para a razão que o informa, tornando-se filosófico. No primeiro caso, temos um saber útil; no outro, um saber liberal, ´gentlemanly´. Embora a vida não possa existir sem o útil, torna-se muito mais nobre quando preenchida pelo conhecimento filosófico, de acordo com o ´princípio da dignidade real do conhecimento´ (Discurso VI). Por essa razão, no âmbito universitário deve-se falar, não em instrução, mas em educação.” 5) É isso aí. No mais, gosto muito de bolinhos de bacalhau, mas tomo certos cuidados. Quanto à res cogitans, os filósofos aí atrás da tela por favor relevem os excessos e imprecisões.

  2. Mente é uma palavra de sentido bastante claro em discussões filosóficas e científicas, no entanto acho que o autor deveria ter esclarecido melhor o que quis dizer por “alma”, conceito que soa um tanto místico ou vitalista.

    Seja como for, uma maneira de considerar o problema que ele não cogitou é que a mente pertence à categoria dos fenômenos, dos processos, isto é, ela é uma entidade imaterial mas ainda assim física, tendo o mesmo tipo de existência que o movimento, o calor, as reações químicas e a eletricidade. Todas essas coisas não são materiais, dependem de matéria para existir e existem apenas no tempo em que há a matéria que lhes dá substrato. Perguntar-se o para onde vai a mente ao morrer o corpo é como perguntar para onde vai a velocidade quando bate o carro.

  3. Alma é o princípio da vida; é aquilo pelo qual um certo ser é vivo. Não é uma energia, nem uma substância; é, antes, um tipo de princípio ordenador, que faz com que os diversos componentes de um ser vivo visem a um mesmo fim, a vida dele.
    Alma é apenas mais amplo que mente. A mente nada tem a ver, por exemplo, com o metabolismo do ser. Já a alma inclui todas as atividades e capacidades do ser vivo, inclusive aquelas sem qualquer direcionamento consciente.

    Essas propriedades que você cita (calor, velocidade, etc) são todas materiais, características de objetos materiais.
    A mente não é uma propriedade da matéria. Se for assim, então tudo tem mente, assim como tudo tem calor, movimento, etc. Antes, ela implica diversas propriedades (esse homem pensa, ele respira, ele sente fome, etc).

    O que estamos interessados aqui não são as propriedades dos seres vivos, mas a estrutura lógica subjacente a essas propriedades, que é o que ordena seu comportamento.

    Sem tal princípio ordenador torna-se impossível entender o comportamento de um ser vivo. Pensa-se nele como um mecanismo (um relógio mais complexo), mas sem nunca conseguir-se pensar sequer numa explicação possível sobre como esse mecanismo possa funcionar. Explicar a vida de um animal sem referência às suas percepções, desejos e instintos é impossível.

  4. Veja, Joel, eu falei fenômeno, não propriedade. Por exemplo posso falar “pororoca”, um fenômeno que só ocorre no Rio Amazonas. Assim como a mente é um fenômeno que só ocorre no cérebro humano.

    Quanto à alma, acho que realmente você cai em certo vitalismo. Vamos ficar na etimologia do alma=ânimo. Um ser multicelular e grande tem esse “ânimo” misterioso, a propriedade que o torna “animal”. Um bicho num instante está lá, andando, no seguinte ele aparece, exatamente igual, mas morto. Onde terá ido seu ânimo?

    Quando você observa a vida no nível celular, porém, a diferença entre vida e morte é bem evidente. Uma célula viva é uma célula inteira, uma célula morta é uma célula partida – isto é, fisicamente destruída, não algo que perdeu alguma propriedade imaterial. É simplesmente assim, não existe célula morta, mas inteira, como não há televisor quebrado com todas as peças em ordem.

    Um animal morto é um ser em que, por falha de alguma função vital, ocorreu essa reação em cadeia e não-simultânea, que leva muitas horas, de serem destruídas todas suas células. O que ainda parece externamente ordem é desordem, entropia. Você pode chamar de alma ou simplesmente vida o que mantinha coeso esse conjunto, mais isso é apenas o o fato de que o equilíbrio do processo vital ainda não havia sido perturbado de forma letal.

    E note-se que situar onde está a morte é um problema cuja resposta já mudou. Até inventarem o desfibrilador, era morto a quem parava o coração, porque efetivamente o único prospecto dali por diante era a decomposição. Hoje, considera-se morto alguém que perca a função cerebral, cujo prospecto também seria a decomposição, não fossem os aparelhos.

  5. Mas veja o problema de encarar a alma, ou mente, como fenômeno do cérebro: em primeiro lugar, volta-se ao dualismo (separação entre mente e cérebro) e tem que se afirmar que o cérebro, físico, seja causa de um fenômeno não-físico (afinal, os estados mentais não observáveis e experimentáveis de fora, por um observador do cérebro).

    Em segundo, a mente e tudo o que se passa nela, deixa de ser explicação sobre como e por que o homem (ou outro animal) age, e passa a ser uma conseqüência de seu funcionamento. Isso dá origem a infinitos paradoxos: por exemplo, ao escrever estas linhas, não estou sendo levado por nenhuma idéia ou vontade de convencer alguém nem nada disso; são apenas os meus neurônios reagindo aos estímulos externos que mexem meus músculos de maneira a escrever este texto.
    Não estou escrevendo este texto porque acredito nas idéias nele contidas (na verdade, nem é possível falar em idéias contidas no texto), mas sim porque meus neurônios mexem meus músculos desta maneira. Sendo assim, qual a probabilidade de se escrever uma linha que seja ao invés de simplesmente teclar a esmo?

    Se a realidade mental, isto é, os significados e pensamentos, perdem qualquer eficácia causal, fica impossível explicar mesmo as mais simples ações do ser humano, como fugir de uma cobra, dar uma ordem, etc.

    E mesmo você, ao escrever suas respostas, não está defendendo nem pensando nada; são apenas reações motoras aos estímulos externos.

    Não defendo a alma como uma energia, algo “a mais” no corpo do ser vivo. Ela é a estrutura lógica do ser vivo. Claro que, para perdê-la, é preciso que algum componente do animal seja destruído. Mas ela não está dada em nenhum dos componentes.

    No fundo, a visão da mente como fenômeno (ou epifenômeno, como é em geral chamada) é uma forma de vitalismo, de criação de uma entidade, ou energia, não-física. O corpo está lá, funcionando perfeitamente, sem precisar de qualquer princípio fora as leis mecânicas da engenhoca. Mas, magicamente, esse processo produz um subproduto singular: sentimentos, pensamentos, idéias, desejos, todos eles não observáveis diretamente e fechados a quem os experimenta. Todo processo físico produz essas entidades não-físicas? Se não, por que alguns sim e outros não?

    O significado de um livro não se confunde com o formato geométrico das letras nele impressas; não é a análise das letras que nos permite entender o que um livro quer dizer. No entanto, não dá para separar as duas coisas. Mude as letras e terá mudado também o significado.

  6. Isso me parece uma questão de escopo: não é porque existe a floresta que é errado estudar a árvore, e não é por se estudar a árvore que não se sabe que existe a floresta. Depende do que se decida olhar, árvore ou floresta, uma não é menos real que a outra, e isso não muda o fato de a resposta para “de que é feita a floresta?” continuar sendo “árvores”. Você pode explicar uma viagem em termos de consumo de combustível e aceleração em vetores newtonianos do carro; ou sua vontade de encontrar a namorada – ambas são verdade e não se excluem.

    Eu não sou monista e acho que a identidade do que é “você” não está no corpo. Por exemplo, com transplantes seria possível substituir parte por parte do cérebro – se conseguíssemos de alguma forma preservar a memória e características da personalidade, ao fim você teria a mesma pessoa.

    Mas duvidar da fisicalidade da origem da consciência é duvidar de sua capacidade de ficar bêbado. Ou de chorar vendo um filme, uma coisa que saiu de um disco de metal riscado. O filme, sua mente e a bebedeira existem de uma forma que não é a mesma que seu cérebro, o DVD e o vinho.

  7. Brilhantes replies os seus, Joel.

    Há que se frisar também o princípio “ativo” de nossa mente, por exemplo, quando fazemos abstrações, sejam “automáticas” ou a bel-prazer, separando (abstraindo) elementos da realidade circundante para destacar outros.

    Tanto a percepção quanto o conhecimento só são possíveis porque nossa mente adota uma “postura” frente à realidade.

    Se a mente fosse puramente mecânica material, a realidade lhe atingiria como uma massa caótica de elementos, sem distinções, impossibilitando a mínima formulação lógica, ou mesmo a percepção.

    É uma constatação facilmente observável.

    Ademais, ok, o cérebro processa dados, etc., mas QUEM é que vê, quem é que cheira, quem é que escuta? A mim sempre pareceu uma pergunta seminal. Um amigo viciado em Filosofia da Mente certa vez me disse que é o Universo que percebe a si mesmo. Ora, por favor…

  8. Muito bom seu texto, Joel! Tomei a liberdade de enviá-lo para alguns blogs de amigos meus.

    Quanto a questão de a mente (e a alma) ser um epifenômeno da matéria (ou, nos dizeres de Ratzinger, um mero “bolor casual da matéria”) eu colocaria duas dúvidas:

    1 – Se a mente é tão fenômeno da matéria quanto o calor, movimento ou velocidade devo, então, supor que em algum momento expressões humanas como desejo, amor, confiança, amizade, etc serão também mensuráveis e quantificáveis?

    2 – A alma animal e a alma humana diferem apenas quantitativa/mecanicamente ou há entre elas uma diferenciação substantiva?

  9. Considero construtivo para esse debate usar a palavra CONSCIÊNCIA no lugar de alma ou mente.

    A consciência presume reconhecimento de si, e distinção entre o si mesmo e o ambiente, o que classifico como a operação mental mais básica

    A consciência é resultado do funcionamento do cérebro, um cérebro (saudável) funcionando produz consciência

    “A idéia do espírito humano foi construída a partir de um objeto: o corpo” (Espinoza; Ética).

    Os Homens são corporificações que possuem ser e existência, um fato que os singularizam no universo, onde quase tudo o que existe não possui ser.

    Algo tem Ser, quando reconhece a si como individual e distinto do ambiente. Algo tem ser quando tem consciência. E pode intervir sobre esse ambiente sem desfazer sua organização estrutural básica, sua essencialidade.

    Algo que possua consciência, deve antes existir

    Paradoxo: Entretanto, um substântivo abstrato como a Felicidade, embora constitua um fato emocional para os seres humanos, não é algo que exista como coisa física. (Nem tudo o que existe tem organização estrutural própria).

    A felicidade é algo que requer o veículo humano para ter existência, sem ser entretanto uma criação humana, mas conseqüência de os homens possuírem uma realidade emocional que reverbera de acordo com os estímulos da realidade externa e concreta.

    A felicidade é um tipo de consciência. Assim como para um carro se deslocando, a curva é um tipo de movimento

    Não considero a consciência epifenômeno do corpo. Considero a consciência realmente uma área física do cérebro. Eu me explico. Assim como o olfato percebe o cheiro, assim como a visão percebe as cores (córtex visual), uma estrutura específica no cérebro perceberia os diversos fatos mentais (pensamentos, imaginação, sensações do corpo) estabelecendo a partir deles a ilusão do eu

    Bom, esses foram os meus pitacos, ressalto que não sou da área

  10. (…)desse modo, um individuo não é apenas um punhado de moléculas, mas um bocado de eletricidade também(…)

  11. Olha, estava lendo um artigo sobre Bernard Lonergan na Dicta no 1, e encontrei uma explicação muito próxima do que expus brevemente aqui neste thread.

    http://www.dicta.com.br/edicoes/edicao-1/a-inovacao-de-bernard-lonergan/

    “Bernard Lonergan demonstra que a imposição de quadros conceptuais à experiência através de actos de intelecção exige o ser, ou o ‘virtualmente incondicionado’, porque o ser é, simplesmente, ‘tudo o que há para conhecer’

    O objecto do conhecimento é o mundo tal como ele é, o ‘universo da probabilidade emergente’ que se pode desenvolver segundo vias diferentes. Nele, o homem realiza escolhas para que o possível se torne mais provável e, oportunamente, actual. Como opera com juízos de valor, deliberações e escolhas, constitui um horizonte de sentido mais amplo que os actos de conhecimento.”

    Sensacional. Terei que acessar urgentemente a obra deste sujeito!

  12. Pingback: Deus lo Vult! » Diversos

  13. eis mais uma versão do conto do relojoeiro cego. parece que o autor concorda com essa analogia então que aquilo que nos constrói (DNA) tem uma origem espiritual ou divina, com eu vi em um site Criacionista que afirmava que o DNA era a “linguagem de Deus”.
    Se o DNA é a linguagem do Deus Cristão, Ele deve ser analfabeto ou desconhecer as regras da ortografia e gramática da própria linguagem, basta lembrar que existe o cancer e as aberrações genéticas.
    Mas o autor preferiu falar de tijolos e olarias, certamente se recordando da passagem bíblica que fala que o Homem foi feito do barro.
    Pois bem, no mesmo intento, dizer que o Homem é criação do Deus Cristão é o mesmo que dizer que todas as construções da cidade de São Paulo são obras de Paulo Maluf. E não são. Diversos prefeitos/governadores participaram daa obras, diversos engenheiros participaram das obras, diversos arquitetos participaram das obras, diversos pedreiros participaram da obra, os materiais foram fornecidos por muitos fornecedores, etc.
    o Deus Cristão é apenas um dos Deuses que tiveram participação na grande obra chamada humanidade.

  14. Roberto (bom, agora que está na página 2, não sei se este comentário será lido, mas vamos lá):

    Filosoficamente, não cabe falar em “Deus cristão”, “Deus muçulmano”, “Deus judeu”. Ou o universo tem uma causa externa a si mesmo (“transcendente”) ou ele próprio se causou e constituiu. Se ele tem essa causa primeira, é a isso que chamamos de Deus. Até onde eu possa ver, é possível sim provar racionalmente que o universo tem necessariamente essa causa primeira, um ser absoluto do qual todos os outros seres dependem para sua existência. Esse ser não é contingente, não pode ser diferente do que é, não é um caso específico de uma classe maior que admite vários membros. Mas isso é uma outra discussão, talvez para outro post aqui no site.

    Como você bem diz, existem câncer e ABERRAÇÕES genéticas, ou seja, erros no processo de cópia e transmissão da informação contida no DNA; o projeto em si é bastante complexo e simplesmente impressionante, uma maravilha mesmo (acho que qualquer cientista, ateu ou religioso, concordariam com essa afirmação).

    E se você reconhece o projeto do ser humano como tendo falhas, então seu intelecto é capaz de conhecer a verdade e identificar os erros – capaz, em suma, de fazer um projeto (um DNA) melhor, se tivesse o poder e a informação detalhada necessária. É, portanto, superior à mente que criou esse projeto (se é que ele foi criado por uma inteligência). Ora, mas você é um caso particular, umas das incontáveis possibilidades, desse projeto. Portanto, a mente que criou o projeto do ser humano criou você. Portanto, essa inteligência teria criado algo mais inteligente que ela mesma – o que não é pouca coisa!

    Sobre se a alma humana tem, diretamente, uma origem sobrenatural, ou se é fruto de eventos naturais, não tratei aqui. Quis apenas mostrar como é injustificado o reducionismo fisicalista que reduz o homem a um aglomerado de matéria, como se isso, as moléculas particulares que formam o nosso corpo, fosse o essencial do ser humano. O essencial não são os tijolos, mas o projeto (heh- não, eu não tinha pensado no barro bíblico ao dar o exemplo), embora, é claro, a casa precise de ambos para existir. No caso do homem, o essencial não são as moléculas, mas a alma, pelo qual eu quis dizer não a “coisa pensante” cartesiana, o fantasminha que habita a máquina, mas sim a estruturação lógica, a forma de proceder e se comportar e as capacidades do ser vivo. No caso do homem, isso inclui a racionalidade.

    Acho que você encarou meu texto como uma apologética do Cristianismo, mas eu te asseguro que não é preciso ser cristão para concordar com o que está aí. Aliás, muito do que está aí foi baseado nas minhas leituras da Mary Midgley, que não acredita em Deus.

  15. interessante seu comentário, mas eu devo salientar que esse conceito da Causa Primeira – que eu chamo candidamente de “recurso ex-machina” – veio de Platão e o conceito de Logos, convenientemente utilizado pela Igreja e assimilado pela cultura popular.
    em termos fenomenicos/metafisicos, temos primeiro que definir o que se considera Universo. O que o senso comum diz do Universo está, em minha perspectiva, no conceito Cosmo. Ou seja, o evento conhecido como Universo não se restringe ao Cosmo, mas são diversas dimensões, um evento que simplesmente existe na forma de espaço. espaço necessário para que exista até mesmo essa tal Causa Primeira – bereshit ha elohim – um demiurgo que age sobre algo e o transforma. ou seja, os elementos também são coexistentes a esta entidade e como são elementos combináveis, nem sempre o resultado é o esperado – onde entra o acaso tão retumbantemente elogiado pelos ateus.
    ou seja, é necessário que exista algum evento onde se possa desenvolver a Causa Primeira, os Deuses, os átomos, o Big Bang – o evento Universo. Onde o potencial da existência e da vida possa surgir, a partir de vibrações, ondas primeiro para então se combinarem e formarem entidades e almas e disto para diante, conforme a interação entre os elementos/entidades/meio, para que a nenhum seja dado maior importância ou poder sobre os demais.
    nisso entra nós e a teoria da evolução, da qual nós somos um tanto gerados pelos Deuses e outro tanto produzidos pelas Probabilidades.

  16. Bom, se tem uma coisa que Deus (falo no sentido filosófico mesmo, de causa primeira, de ser absoluto e necessário) não é é o demiurgo platônico.

    Quanto ao demiurgo, estamos de acordo: ele é um ser contingente, é parte do universo (ou cosmo). É, para usar já a linguagem da filosofia de tempos cristãos, uma criatura. Uma criatura imaginária e inexistente.

    Você chama o universo de um evento. Ok, pode chamá-lo assim, embora eu ache que essa linguagem pode ser enganosa (um ser humano e uma pedra são também “eventos”?). Agora me diga: esse evento é necessário? Em outras palavras, conhecendo-se o que o universo é, pode-se concluir logicamente que o universo existe? É logicamente impossível que o universo fosse diferente (mesmo em detalhes minúsculos) do que ele é?

    No final das contas, de duas uma: ou afirma-se que o universo é necessário, o que é, no mínimo, uma afirmação dúbia, já que ele está sujeito a todo tipo de mudança, teve um estado inicial e dirige-se a um estado final e, ao que tudo indica, poderia ter sido diferente do que de fato é; OU então admite-se que o universo é contingente (um evento que poderia ou não ter sido, e que poderia ter sido diferente do que é) e que, portanto, tem uma causa externa a si mesmo. E voltamos à causa primeira.

    Para que uma cadeia de seres contingentes exista é preciso que haja, na origem dela, um ser necessário, uma causa necessária, ou então cai-se numa regressão ao infinito na qual nenhum dos elementos da cadeia pode existir.

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