“Eu quero ser proxeneta”

Quando você achava que tudo iria terminar em apocalypse now, quando você achava que, depois da Caritas in Veritate, agora temos de nos render à Autoridade política mundial, aí vem Steven Pinker e nos diz que, não, está tudo bem, que estamos cada vez menos violentos.

E aí você pensa. Pensa várias vezes. Dedica preciosos minutos do seu tempo que se escoa a respeito desse assunto. Seria muito bom se isso fosse verdade. E você lê o texto. Mi-nu-cio-sa-men-te. E nota que, no meio do raciocínio de Pinker – o psicólogo social que tenta ser um Richard Dawkins softcore e se parece assustadoramente com o Roger Daltrey do The Who -, ele argumenta que violento era o pessoal da Bíblia. Vocês sabem, aquele povo que tinha de lutar com todo mundo porque, afinal, Deus o escolheu como o mensageiro da humanidade.

Mas ele vai além. Uma das grandes razões da nossa evolução foi porque Thomas Hobbes estava certo. Hobbes: o mesmo que usou e abusou do medo, da violência – e que também queria uma Autoridade política mundial (mais inglesa, é verdade, mas naquela época a Inglaterra era o mundo). Conhecem? Pinker também quer mostrar que conhece – só que ele confunde as bolas. Comete um erro crasso: julga que violência é apenas quebrar os ossos e os músculos de alguém. Nãnaninanô. Vamos voltar a René Girard (esqueceremos um pouco o coitado do Voegelin porque, afinal, este escriba é muito mais versátil do que se pensa): a cultura ocidental é feita através da violência, através do sacríficio do bode expiatório, do triste infeliz que paga o pato para todo mundo e assim todo mundo fica feliz e continua a vida em sociedade. (Pelo menos, foi o que eu li no meu A Violência e o Sagrado para dummies*.) E agora vem a pergunta de 1 milhão de dólares: será que Pinker observa algum aspecto sacrificial na cultura ocidental? É claro que não: temos apenas as estatísticas de que a violência diminuiu conforme o progresso humano. E outros tipos de violência, como a psicológica, a sexual, a subliminar – não contam?

Não, não contam. Steven Pinker é o típico intelectual pós-pós-pós moderno, o que é a mesma coisa que um pastel ambulante. Há um grupo de pessoas igual a ele que grita: “Queremos paz!”. E, por isso, temos o Papa querendo a ONU ao cubo, o Obamis negociando com meio mundo (e perdendo feio), a ONU negociando fetos – e os únicos que não entraram na tirania da conciliação foram os pobretões de Honduras, coitados, um bando de golpistas, é claro.

É claro. Tudo está claro para vocês, não é mesmo? A única coisa que está clara para mim é que, depois disso tudo, quando crescer quero é ser proxeneta**.

* Não precisam fazer isto. Existem duas opções – ambas trabalhosas, o que deve demandar dificuldade para vocês, que têm sempre um lado pendente para a preguiça. A primeira é ler esta longa e recente entrevista com René Girard, em que se comprova que tudo o que Steven Pinker disse é uma besteira sem tamanho; e a segunda é ler Coisas Ocultas Desde a Fundação do Mundo, publicado recentemente pela Paz e Terra. Disse que não era preciso ler Girard. Mudo o que disse: leiam René Girard antes que o mundo exploda.

**Caros leitores (podia ser pior: poderia chamá-los de caros amigos…): por favor, antes que pensem que eu caí para o reino da libertinagem, cliquem no link acima e vejam que a violência – aquela que Mr. Pinker diz que está a acabar – também pode ter o seu lado nonsense.

5 comentários em ““Eu quero ser proxeneta”

  1. Martim,

    Sem querer entrar no detalhe das inferências e metodologia do artigo trago, abaixo, uma citação de Ortega y Gasset, já que o Pinker quis citá-lo (sem, provavelmente, tê-lo entendido) que, para mim, descreve magistralmente cientistas como ele:

    “”E, com efeito, este é o comportamento do especialista (cientista). Em política, em arte, nos usos sociais, nas outras ciências tomará posições de primitivo e ignorantíssimo; mas a tomará com energia e suficiência, sem admitir – e isto é o paradoxal – especialistas dessas coisas. Ao especializá-lo a civilização o tornou hermético e satisfeito dentro de sua limitação; mas essa mesma sensação íntima de domínio e valia o levará a querer predominar fora de sua especialidade. E a consequência é que, ainda neste caso, que representa um maximum de homem qualificado – especialismo – e, portanto, o mais oposto ao homem-massa, o resultado é que se comportará sem qualificação e como homem-massa em quase todas as esferas da vida.” (in “A rebelião das massas”)

  2. Gostaria de ser chamado de Caros Amigos, muito mais social e cordial.
    Não conhecia vocês, adentrei pela primeira vez, mas vi não ser minha praia, pois eu remo no sentido contrário da dita (sic, associei com ditaduta, da dicta). Ideais diferentes e opostos. Não torço contra, mas percebo que com a linguagem utilizada atingirão uns poucos.
    Tô em outra, tcha…
    HPA, de Bauru SP

  3. Steven Pinker é o maior psicólogo cognitivo da face da Terra. Todos os livros dele são maravilhosos e com uma simplicidade incrível.e esclarecedora.
    Há mais de 60 anos não existe uma guerra na Europa, o que significa que a violência já diminuiu muito.
    E como ele mesmo diz a violência irá diminuir ainda mais com o aumento do círculo moral( lei o livro Tábula Rasa).
    Por fim, muitos não gostam dele porque ele não acredita na religião, acha tudo uma farsa, uma forma de controle social.
    Todos os argumentos dele são muito bons, por isso ele desperta raiva nas pessoas.

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