From Russia With Love

Vejo com interesse a notícia de que algumas agências de turismo russas vêm oferecendo cruzeiros na costa da Somália, a clientes que pagam pequenas fortunas para participar de viagens de caça aos piratas que aterrorizam a região.

São iates fortemente armados que percorrem e patrulham calmamente – a menos de 5 milhas náuticas – uma das rotas marítimas mais perigosas do mundo (Djibouti a Mombasa), à espera de eventuais ataques dos famigerados piratas africanos. Uma vez abordados pelos bandidos,  os barcos respondem com lançadores de granadas, metralhadoras e até pequenos mísseis.

A partir daí, surgem problemas bastante interessantes. Sem pensar muito especificamente nas questões técnicas de Direito Internacional, o que dizem disso os liberais e libertários em vocês? O Estado deveria interferir e proibir esse tipo de coisa? É moralmente admissível, em se tratando “apenas de uma reação”? Cartas para a redação.

12 comentários em “From Russia With Love

  1. Acho bem questionável a motivação que leva os clientes desse serviço a se inscrever nele. Mas, se é verdade que só atacarão como retaliação, então não acho que deva ser proibido, não. Pelo contrário, vão provavelmente diminuir o número de piratas na região, o que ajudará muito as empresas que transportam seus bens por lá.

    E claro: se eles levarem a pior no conflito, é o risco com o qual eles aceitaram arcar.

  2. Sim, para a teoria libertária, legitima defesa é um direito legítimo. Estado numa hora dessas? Pra quê? Os libertários julgam que o Estado piora as coisas, tornam conflitos locais em “guerras totais”, expandem seu poder, infantilizam os indivíduos, degeneram a sociedade.

    Se você ler Rothbard, Hoppe, etc., verás que esse problema não gera nenhuma razão para justificar o Estado.

  3. Acho que o Estado, seja ele qual for, deve tapar o nariz e deixar o Detefon rolar solto… É absolutamente legítimo o extermínio dessa praga, sobretudo quando albergado no direito à legítima defesa.

  4. Post interessantíssimo, muito mesmo.

    Ao meu ver, é legítimo o safári de piratas, que já faz um bom tempo, inclusive, em que pilham e destroem sem qualquer retaliação à altura. Sendo o(s?) Estado(s?), neste caso, incapaz(es?) de responder com paridade de armas, a quem quiser ir ao combate, não vejo problema algum em tal empresa.
    O problema é se virar bagunça, como se já não bastasse, neste caso particular, o banho de sangue.
    E o preço do pacote turístico? Precisa-se de formação militar, ou basta, no mínimo, já ter acertado alguma lata como alvo?

    (Particularmente, eu não me arriscaria a tanto.)

    Exelente post, mais uma vez. Fica então este meu esboço apressado do que acho a respeito.

  5. Qual a diferença entre esse grupo de “turistas” e a milícia privada nos morros cariocas? Aceitar isso é institucionalizar a barbárie, pois o objetivo desses grupos é praticar “tiro ao alvo” em seres humanos e não se proteger.

  6. O objetivo é enfrentar e eliminar os piratas criminosos. Concordo que a motivação dos participantes pode ser bem errada, mas não necessariamente o é.

    Numa sociedade organizada, o justiceiro (salvo raros casos de exceção) age mal. Mas em situações nas quais não existe ordem estabelecida, o justiceiro age bem (desde que, obviamente, combata criminosos).

  7. Primeiramente parabenizo a corajosa, quando não formidável, empreitada da Dicta&Contradicta em criar uma ilha de excelência num país como esse. Espero que não tenha o fim da Primeira Leitura – irmã antecessora, não de gênero, mas de qualidade editorial. Quem sabe esta não pode ser a Modern Age, Sallisbury Review, City Journal, Commentaire, ou New Criterion do Brasil? Decerto wishful thinking, mas por que não tentar?
    Quanto à pirataria contemporânea no Chifre da África e a notícia acima comento.

    1. Pelos centenários costumes da Lei Marítima a pirataria, e por inferência os piratas, são considerados – assim como os terroristas – hostis humani generis ou inimigos da humanidade (vide Convention of the High Seas 1958 e UNCLOS 1982, art 101). A atividade é tão abjeta que é dever de qualquer Estado minimamente organizado julgar em tribunal marcial os fatos e, caso culpados os réis, puní-los com a pena capital. A propósito o mesmo tratamento ao qual submeteria terroristas capturados em campos de batalha tal como consta no jus ad bellum – são igualmente hostis humani generis ao meu ver. Ao invés disso no resort de Guantánamo todos saíram mais saudáveis do que entraram, pois receberam cuidados médicos; e dos libertos cerca de 13% retornaram a matar soldados americanos. Desculpe-me pela digressão.

    2. Conter a pirataria moderna é uma atividade extremamente custosa e sofisticada, portanto nem todas as marinhas podem exercer todas as etapas – desde a monitoração à execução preventiva – necessárias a tal atividade policial. Dentro desse escopo, o litmus de legitimidade e legalidade para tratar e conter a pirataria pertence primeiramente ao Estado organizado (mais sobre isso depois). Como o 5º Strike Group da Marinha norte americana não patrulha mais essa área desde as operações no golfo pérsico e Oceano Índico (Iraque, Afeganistão e Irã) a pirataria na terra nula do chifre da África ocupou esse vácuo de poder numa das mais importantes rotas marítimas do mundo. A atividade descrita no post é decerto um barbarismo peculiar dos nouveaux riches russos. “Sergei, já fomos ao espaço ano passado, que tal matar uns negrinhos da África este ano?” Não se trata neste caso de direito à auto-defesa, vez que premeditado. Uma tripulação comercial em situação de ataque tem, sem dúvida alguma, o dever e direito de exercer a auto e legítima defesa.

    3. Existe uma íntima correlação entre o terrorismo marítimo, a pirataria contemporânea e os Estados falidos (vide Martin N. Murphy, IISS Adelphi paper 388, July 9, 2007). A Câmara Internacional do Comércio (ICC) tem um serviço de alerta marítimo de monitoração da pirataria, uma vez que 80% do transporte comercial global se dá pela via marítima. Segundo consta somente nos primeiros seis meses desse ano 240 ataques já ocorreram – ou se quiser adotar a nomenclatura de Obambi, man-made disasters. Dos quais 531 tripulantes foram rendidos, oito seqüestrados e seis mortos. Por que a relativa inação? Pode parecer revoltante, mas os custos para conter a pirataria são mais altos que os premiums dos seguros marítimos e acordos de resgate. A triste verdade é que dos estimados $8,8tri de mercadorias movimentados pelos mares somente 0,002% a 0,12% representam valores perdidos nesta atividade abjeta. Outros especialistas estimaram a perda mundial entre $15bi a $25bi em 2007 (não atualizei os dados). Não padeço do paternalista complexo de culpa pós-colonial no qual a simpatia aos piratas é de rigueur aos politicamente corretos dado o passado colonial. Posto que pobres, negros, e ex-vítimas do imperialismo são incapazes de exercer o julgamento ou ser responsáveis por seus atos, devem ter seus motivos os quais certamente não devem ser julgados por nós, caucasianos. Em suma foi o que escutei no início do ano na República Socialista de Massachusetts antes de retornar ao Brésil. Razão pela qual também existe um temor em realizar uma missão conjunta de patrulha na área, salvo esforços pontuais dos Indianos ou Russos. Atacar as bases Somalis de onde originam os ataques seria particularmente impensável na atual administração devido ao histórico Americano em 1993 e às dificuldades orçamentárias e materiais da marinha Americana nesse setor (estariam sobre a jurisdição do Centcom ou do PaCom?). Ademais teria de ser complementada com os seguintes requisitos de combate: barcos adequados, força policial treinada e honesta com ótimo conhecimento das condições geográficas e marítimas locais, inteligência confiável sobre os piratas, bases de comando e controle em terra além de suporte aéreo. Que país, e não vale a Etiópia, tem capacidade e vontade política para tal na região visto que os piratas são mulçumanos?

    4. Em razão da patente inação estatal que fazer então? Ações justiceiras não passam de inúteis devaneios táticos, sequer estratégicos. Seria mais sensata uma coordenação dos principais shippers para contratar, por que não, grupos privados mercenários capazes de defesa passiva (em caso de abordagem). Adotar comboios seria provável, ainda que difícil ante uma proteção de empresas de exércitos mercenários. O problema é que, pelo que saiba, inexistem empresas com aparato sofisticado o suficiente para tratar da matéria (acho que nem a BlackWater poderia fazê-lo). Por exemplo, julgo que precisariam, no mínimo, de um grupo de reação rápida dotado de porta-aviões anfíbio (suponha: classe San Antonio para missões em terra aerotransportáveis), duas lanchas de combate litoral e um navio de suporte logístico. Só o custo estimado do nono navio anfíbio da classe San Antonio ficou avaliado em $1,398 bi, imagine para o restante da flotilha. Um aviso aos libertários, o custo de oportunidade e risco do empreendimento só disponibilizaria a ação privada se as perdas no golfo de Aden e estreito de Málaca ultrapassarem a 0,45% ou mais do total de transporte marítimo mundial -estimo. Caso contrário o que teremos serão imbecis Russos sem saber como gastar seus petrodólares.

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