Maçãs Podres

A grande ironia da semana passada não foi o fato de que metade da raça humana chorou a morte de um homem para quem jamais trabalharia em hipótese nenhuma, mas sim o fato de que este mesmo homem morreu justamente em um momento em que um bando de desocupados resolveu protestar contra a ganância do sistema financeiro representado por Wall Street.

A relação subterrânea entre o falecimento de Steve Jobs – um empreendedor genial, sem dúvida, mas capaz de forçar seus empregados a trabalharem dezessete horas ininterruptas e ainda ficar insatisfeito com seu trabalho sem proferir um único elogio – e os protestos agora apelidados de “Occupy Wall Street” é de que ambos os eventos se ligam por meio do ressentimento e do rancor.

Sei que muitos chiarão, dirão que “lá vai de novo esse cara com suas digressões apocalípticas”. Contudo, a Apple e seu criador sempre se basearam no incentivo do desejo de que eu sou um cliente exclusivo e elegante – e deu certo porque, olhem só, eu também sou proprietário de um IPhone – com seus gadgets sofisticados; e o movimento de protestos em Wall Street se baseia no fato de que todos ali desejam estar no poder para terem as mesmas regalias que os grandes bancos e os políticos já usaram e abusaram – o mesmo princípio que, aliás, também anima os protestos contra a corrupção que começam a infestar neste Febeapá.

Entre o desejo de ser exclusivo e o desejo de ter um poder que ninguém quer me dar, mas que quero a qualquer custo, as duas pontas do inferno metafísico se tocam e somos bem-vindos ao maravilhoso mundo do subsolo.

Afinal de contas, agradecemos ao old Dusty pelo diagnóstico alcançado: somos todos homens doentes, sofrendo de achaques do fígado ou do pâncreas. O problema é que, quando morrermos, ninguém sentirá a nossa falta ou fará tributos espalhados pelo mundo.

6 comentários em “Maçãs Podres

  1. Precisa análise, Martim. Dentre um amontoado de odes e cantigas nos últimos dias, seu texto foi um lapso de lucidez, pois finalmente alguém relacionou o modelo de gestão de Jobs com a apocalíptica (sim!) ânsia de poder em cada indivíduo (como vc e eu, clientes dos elegantes e “exclusivos” iPhones). Abs. PH

  2. Sem dúvida um dos argumentos mais baixos que vi nos últimos tempos. Revela uma grande preguiça por parte de quem escreveu, tentando esconder falta de tato com opinião de mesa de bar.

  3. A análise foi boa, mas ingênua. Afinal não é prerrogativa da iniciativa privada proporcionar regalias morais e emocionais a quem por ela se mantém e sobrevive. Esse chororô do “não sou reconhecido pelo grande mestre” ou “trabalho muito para pouco” é coisa de latino. A não ser que os EUA estejam se latinizando… A não ser que, ao final, os EUA agora sejam mais um país dentre o mar de outros que tenta criar ações afirmativas de “valorização das classes de trabalho”.

    Ora, é ver que a Apple é a empresa dos sonhos de muita gente. Não porque é uma empresa em que os funcionários trabalham sobre puffs ao chá verde, mas sim por ter, na América do Norte, os melhores salários. Ponto.

    O resto é papo-furado.

  4. Enquanto isso, ninguém fala de Dennis Ritchie, que fez muito mais para a tecnologia do que o tal do Jobs. Chega a ser ridículo!

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