Antologia alemã

por Nelson Asher

Rainer Maria Rilke (1875-1926) nasceu em Praga quando esta cidade ainda pertencia à Monarquia Austro-Húngara. Criando uma obra aparentemente alheia a tantos acontecimentos, como, por exemplo, a Primeira Guerra Mundial ou a Revolução Russa, que praticamente varreram do mapa a Europa que conhecia e apreciava, tampouco fez questão alguma de aderir abertamente à poesia que ou prenunciou tais eventos ou foi, até certo ponto, gerada por eles – a do expressionismo alemão e demais “ismos”. Nem por isso o que escreveu, se examinado com atenção, deixa de ser o sismógrafo espiritual de sua era, de modo que, hoje, ela é lida paralelamente a/ou em conjunto com obras mais explícitas, como o “Waste Land” de T.S. Eliot – poema aliás publicado no mesmo ano mágico de 1922 que viu surgir uma imensa variedade de obras notáveis e vitais, entre a quais se encontram as mais célebres do próprio Rilke: as “Elegias de Duíno” e os “Sonetos a Orfeu”.

Paul Celan (1920-70), poeta de expressão alemã, nasceu em Czernowitz, cidade que, então pertencente à Romênia, fora, até o fim da Primeira Guerra, parte da Áustria-Hungria. Judeu, foi deportado para os campos (onde sua mãe seria assassinada) pelos nazistas e seus colaboradores locais. Celan sobreviveu fisicamente, mas não de todo espiritualmente, como também aconteceu com outros intelectuais que passaram por isso: Primo Levi, Jean Améry, Peter Szondi, Tadeusz Borowski. A experiência do Holocausto marcou definitivamente sua poesia, não necessariamente num nível explícito ou descritivo, mas antes em termos estruturais e na sua relação mais íntima com a linguagem em geral (na qual deixou de confiar) e, em especial, com uma língua que era concomitantemente sua e de seus carrascos – de cuja sobra sombra, aliás, ele nunca se libertou, escolhendo, enfim, o suicídio nas águas parisienses do rio Sena. “Fuga Fúnebre” é um de seus poucos textos relativamente explícitos acerca dessa experiência central e letal. É também seu poema mais famoso e, talvez, o poema mais lido e comentado dentre os que se escreveram na Europa após Segunda Guerra.

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