O grande irmão agradece

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Se vocês acham que eu era paranóico demais, esperem ler as seguintes matérias. A primeira é do Daily Telegraph, que está aqui – e como ainda não entrou no desespero do “conteúdo pago” pode ser lida sem nenhum problema (exceto, é claro, se você for monoglota, mas a solução neste caso é usar o Joogle).

A segunda é da Folha de S. Paulo, que faz muito tempo que pratica aquilo que Henry James chama de a volta do parafuso, seja com a sua credibilidade, seja com o seu bolso (no caso, o meu também), e que, por isso, copio aqui sem nenhum remorso pois o que esta notícia informa deveria ser de notório conhecimento de todos:

Em “era tecnológica”, PF testa avião-espião e novo tipo de grampo

Aeronaves não tripuladas serão usadas a partir de dezembro para monitorar fronteiras e combater o tráfico de drogas em favelas

Com o acompanhamento do CNJ, a polícia desenvolve sistema de interceptação telefônica que prescinde de intermediação das teles

FLÁVIO FERREIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Um “supergrampo” que não depende da intermediação das operadoras de telefonia e “aeronaves-espiãs” não tripuladas vão equipar a Polícia Federal nos próximos anos. O novo sistema de interceptação telefônica está em fase final de desenvolvimento, e os aviões do programa VANT (Veículo Aéreo Não Tripulado) começam a operar em dezembro.
Para realizar escutas atualmente, a PF é obrigada a contar com funcionários e equipamentos das empresas de telefonia. O sistema hoje é considerado “passivo”, pois apenas grava ligações a partir de canais que as operadoras criam em cumprimento a decisões judiciais.
A nova estrutura de interceptação, chamada de “invasiva”, possui equipamentos de varredura digital que permitirão à PF ter acesso aos sistemas das companhias sem a interferência delas.
Autoridades envolvidas na implantação do “supergrampo” dizem que a participação das operadoras expõe as investigações a vazamentos e dá margem a escutas ilegais, principalmente por meio da falsificação de mandados judiciais. Além disso, a intermediação das empresas gera custo e perda de tempo com burocracia, dizem.
De acordo com o projeto, os grampos poderão ser autorizados pela Justiça por meio digital. Juízes, promotores e delegados responsáveis pelas investigações poderão consultar o sistema a qualquer momento.
A PF está criando os instrumentos de interceptação com o acompanhamento do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), instituição presidida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes, que já acusou duramente a PF de cometer excessos no uso das escutas telefônicas.
O projeto em andamento prevê que o CNJ terá acesso a dados gerais do sistema de interceptação, o que permitirá ao órgão apurar, por exemplo, o número total de grampos em curso em todo o Brasil. Hoje, para realizar essa quantificação, o conselho depende das informações prestadas pelos Tribunais de Justiça estaduais.
Quanto à possibilidade de abusos no uso do “supergrampo”, os envolvidos na adoção da tecnologia afirmam que responsáveis por excessos poderão ser identificados. Dizem que o equipamento só poderá ser acessado com o uso de senhas e irregularidades poderão ser descobertas em auditorias.
Antes de ser implementado nas investigações da PF, o sistema ainda deverá passar por testes em varas do Poder Judiciário nos próximos meses.

Avião-espião
Já as aeronaves-espiãs da PF começam a sobrevoar o país em dezembro, segundo o coordenador do projeto VANT, o delegado Alessandro Moretti.
Munidos de câmeras especiais e radares, os três primeiros aviões do projeto deverão ser usados para combate ao tráfico em São Paulo, no Rio de Janeiro e nas fronteiras do sul do país.
Indagado sobre o fato de um helicóptero da Polícia Militar do Rio ter sido derrubado por traficantes em outubro, Moretti afirmou que tal acontecimento não deve ocorrer com os equipamentos da PF, pois eles vão operar a 7.000 metros de altura. “Só mesmo um armamento de guerra, como um canhão antiaéreo, poderia derrubá-lo. Não acredito que os traficantes cheguem a esse ponto.”
Segundo Moretti, os novos aviões da PF são fabricados pela empresa israelense IAI e o custo total do projeto, que envolve 15 aeronaves, será de cerca de US$ 200 milhões (aproximadamente R$ 345 milhões).

E se você não está assustado, então sugiro que procure um hospício, que, aliás, tem suas virtudes esquecidas, como mostra Oliver Sacks em texto escrito para a Dicta 4.

Mas o fato é que eu quero que você fique assustado – muito assustado. Então, para o seu masoquismo de plantão, sugiro que leia este documento do PT (sim, o PT foi “linkado” no site da Dicta…) e medite sobre o seguinte trecho, em que determina-se o que será feito com as empresas de comunicação a respeito das tais “politicas afirmativas” . Um detalhe: isto não é previsto para ser dito em um comício petista, mas sim na CONFECOM, a Conferência Nacional de Comunicação, a ocorrer entre os dias 1 a 3 de dezembro de 2010:

6 – Políticas afirmativas

Propostas:

a) Garantir concessões para comunidades tradicionais, com recorte para a matriz africana;

b) Garantir paridade racial de gênero na publicidade;

c) Garantir percentual – nos sistemas público, privado e estatal – para programas que tratem da História da África e da população de origem africana no Brasil, considerando a Lei 10.639.;

d) Garantir a participação do movimento negro organizado no Conselho de Comunicação Social e demais órgãos de regulação.;

e) Garantir política específica de inclusão digital para as comunidades tradicionais;

f) Criar penalidade específica para combater o racismo nos meios de comunicação;

g) Propor a inclusão, no ensino público, de matérias sobre a educação para a mídia;

h) Debater o papel da mídia na construção social da imagem das mulheres

Como bem disse Diogo Costa, do Ordem Livre, o assustador neste documento é o fato de que palavras como “democracia” e “pluralidade” são eufemismos para uma outra palavra: censura. Discordo de seu artigo apenas em um ponto: Diogo acredita que se trata de uma medida que incentiva o autoritarismo. É mais do que isso: o que os políticos do nosso tempo querem – não só os do PT, mas também os da Inglaterra, do restante da Europa e nos EUA de Obamis – é sedimentar o totalitarismo cultural, que é apenas um passo para o político.

E o pior é que conseguiram. A primeira prova de que todos nós vivemos em uma sociedade totalitária em termos culturais é a apatia que se vê no semblante de cada indivíduo e, principalmente, a entropia que domina em todas as relações humanas, das sociais até as pessoais.

Alguém duvida disso? Então por que ninguém bota a boca no trombone sobre as resoluções petistas da CONFECOM ou sobre as medidas policialescas na Inglaterra, salvo as exceções de praxe?

Porque o Grande Irmão nos venceu pelo cansaço, só isso. Aceitamos isso tudo porque queremos, antes de tudo, uma vida relativamente tranqüila.

A nossa situação aqui no Brasil está mais para terminar com um suspiro do que com um estrondo, parafraseando os homens ocos de Eliot. A apatia é a nossa instituição favorita.

Por favor, o último que sair apague as luzes.

9 comentários em “O grande irmão agradece

  1. Acrescente:

    1. CPF, identidade única.

    2. Nota Fiscal Paulista.

    3. Recadastramento eleitoral com biometria.

    4. Propostas insanas de regulação do acesso a Web.

  2. E pensar que há não muito tempo ainda havia países onde não era preciso ter pedaço de papel nenhum para existir livremente.

    A unificação dos documentos simplifica um pouco a nossa vida, mas ainda sonho com o dia em que todos os documentos serão abolidos e tudo o que for relativo a mim será feito com meu nome de usuário e senha do Google.

    Quanto à biometria, ê medida inútil, custosa e trabalhosa! Alguém já trabalhou ou freqüentou instituições nas quais ela foi adotada?
    Nas minhas duas experiências com a biometria, ela só tornou tudo mais lerdo. Com carteirinha de proximidade, a catraca abre instantaneamente. Com a impressão digital, demora uns 2 segundos se tudo correr perfeitamente, sem contar os muitos casos de dedo mal-colocado, de gente que aperta demais, de menos e ainda as impressões digital que, por algum, nunca funcionam.

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  4. Caríssimo Martim.

    É realmente assustador! Mas penso ser também necessário e profícuo pensar o totalitarismo cultural não somente em vista do político mas enquanto ele já causa bastante estrago em si mesmo. Pense-se na homogeneização intelectual e na imposição de matrizes religiosas, não católicas, obviamente (e o consequente repúdio à alteridade).

    Abraço.

  5. Pingback: E vai-se a liberdade, novos tempos?! « Blog do Porto

  6. Pingback: CONFECOM, totalitarismo beirando o ridículo « Liberdade de Expressão

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