Oscar 2013 – Parte 2

Segunda parte do texto sobre os filmes concorrendo nas principais categorias do Oscar 2013. A primeira parte pode ser lida aqui.

Les Misérables/Os Miseráveis (em cartaz)

8 indicações

Ator, Atriz Coadjuvante, Filme, Figurino, Cabelo e Maquiagem, Trilha Sonora, Direção de Arte, Mixagem

Anne Hathaway precisa ganhar o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante. Não merece, precisa – e deve ganhar. De fato, há micro-momentos tocantes, em especial quando Fantine canta “I Dreamed a Dream”, mas o que parece um sofrimento genuíno logo se perde em pura ambição, como quando Hathaway aperta os olhos para as lágrimas escorrerem em determinada parte da música. Seu esforço é tão visível – aqui, uma paródia perfeita – que é óbvio que ela precisa do Oscar ou então sua carreira se tornará uma sucessão de tentativas desesperadas de cair nas graças da Academia (mais papéis com mudanças drásticas na aparência? Nicole Kidman, afinal, ganhou por um nariz). Os Miseráveis é justamente isso: uma tentativa desesperada de obter prêmios. Tudo, da fotografia até os figurantes, parece carregar a expectativa de conquistar todos os críticos, todas as lágrimas e todos os aplausos do universo. O musical de Tom Hooper (O Discurso do Rei) é, afinal, o oposto de Amor de Michael Haneke, sem sutileza alguma, se chafurda na dor como um porco no lama. Ao final do filme, senti como se a duração de Os Miseráveis fosse de dois dias corridos e não duas horas e quarenta. Tão exaustivo que não tenho forças sequer para falar mal.

Life of Pi/As Aventuras de Pi (em cartaz)

11 indicações

Filme, Fotografia, Direção, Edição, Trilha Sonora, Música, Direção de Arte, Edição de Som, Mixagem, Efeitos Visuais, Roteiro Adaptado

Há um único motivo para ver As Aventuras de Pi: o tigre. Acredite, é mais que suficiente. Há toda uma parábola religiosa por trás do relato do menino náufrago à deriva em um bote salva-vidas com um tigre, mas não se engane: o filme apenas menciona fé e religião, sem nunca lidar de fato com essas questões. É como uma sessão da tarde, agradável e um tanto sentimental, mas sem muita profundidade – culpa provavelmente do diretor Ang Lee, que transforma até Woodstock em mais uma tarde no playground. O que importa mesmo é o tigre fenomenal. Vejam pelo tigre, pelos efeitos especiais e o som incrível (o tigre!!).

 

Lincoln (em cartaz)

12 indicações

Ator, Ator Coadjuvante, Atriz Coadjuvante, Filme, Fotografia, Figurino, Direção, Edição, Trilha Sonora, Direção de Arte, Mixagem, Roteiro Adaptado

Daniel Day-Lewis é o melhor ator vivo. Mesmo com todas as piadas sobre o seu método um tanto quanto ridículo de imersão nos personagens, não há discussão. Ao contrário de Anne Hathaway como Fantine, poucas atuações nos fazem esquecer do ator em si como Day-Lewis consegue. Mesmo assim, seu papel em Sangue Negro, de Paul Thomas Anderson, continua muito mais marcante e Lincoln também não é o melhor filme, entre os mais recentes, de Steven Spielberg – Cavalo de Guerra continua muito mais belo e emocionante. Composto quase que inteiramente de cenas internas, possui diálogos longos que, por vezes, são tão desnecessários quanto as anedotas do presidente. A vida em família, bem como o conflito com o filho mais velho de Lincoln (interpretado por Joseph Gordon-Levitt) parecem sem importância alguma para a trama que é mais sobre a abolição da escravatura do que sobre o presidente. O resultado é um filme bom, mas que não sabe muito bem a que veio. Deve ganhar os maiores prêmios da noite pelas questões que aborda (com seriedade total, não como Django Livre), mas é tão esquecível quanto O Discurso do Rei ou Uma Mente Brilhante. Para ter uma noção melhor da figura do presidente americano, só assistindo A Mocidade de Lincoln (Young Mr. Lincoln), dirigido por John Ford em 1939, com Henry Fonda no papel principal.

 

The Master/O Mestre (em cartaz)

3 indicações

Ator, Ator Coadjuvante, Atriz Coadjuvante

Pela primeira metade de O Mestre, fiquei esperando o filme começar. Pela segunda metade, fiquei esperando terminar. Como toda obra de Paul Thomas Anderson (Sangue Negro, Magnólia, Boogie Nights), a fotografia é incrível, a música é diferente, espetacular – mas não havia mais nada lá. Mais nada além de Joaquin Phoenix. Sim, Daniel Day-Lewis é o melhor ator vivo, mas Phoenix merece ganhar. Em O Mestre, ele anda como um cabide humano: o pescoço encolhido, os ombros inclinados para frente, a cabeça para trás. Imagine um cabide tão alcoólatra que bebe até óleo de míssil. Da mesma forma que As Aventuras de Pi vale pelo tigre, O Mestre vale pela atuação de Joaquin Phoenix – ele parece, de fato, um bicho, uma criatura. Há uma cena lindíssima em que uma única lágrima faz um caminho demorado por entre as rugas estranhas das bochechas que Phoenix adquiriu nos últimos anos. De resto, não há nada de fato sendo desenvolvido. Sim, o culto retratado é baseado mesmo na cientologia, o questionário de “admissão” é basicamente o mesmo, mas e daí? O filme  não flui como uma progressão, é composto por segmentos – belos segmentos, com excelentes atores e tudo mais – mas sem a força de Sangue Negro, obra-prima de Anderson. A frase mais linda, dita por Phillip Seymour Hoffman, daria sentido ao filme se tivesse alguma relação com o que vem antes ou depois, mas falta conexão ao filme como todo. Pena.

 

Moonrise Kingdom

1 indicação

Roteiro Original

Moonrise Kingdom talvez não seja o melhor filme que Wes Anderson já fez, mas é certamente um dos melhores. Em outubro do ano passado, na resenha que escrevi quando o filme estreou, disse que não é a técnica obsessiva do diretor que provoca tanto fascínio, mas sua habilidade de retratar emoções muito específicas com sinceridade. Relembrando o filme agora, não são os enquadramentos, os detalhes das roupas ou dos objetos que me chamam mais atenção, mas as emoções, por exemplo, da menina que se sente um estorvo para a própria família ou do menino órfão detestado pelos amigos. O que se retém dos filmes de Wes Anderson, muito além da aparência considerada por muitos como forçada, é sempre a substância de algo bastante identificável.

 

Silver Linings Playbook/O Lado Bom da Vida (em cartaz)

8 indicações

Ator, Ator Coadjuvante, Atriz, Atriz Coadjuvante, Filme, Direção, Edição, Roteiro Adaptado

Não é Bradley Cooper a estrela de O Lado Bom da Vida, mas Jennifer Lawrence, a atriz de apenas 22 anos que é a solução para todas as Anne Hathaways desesperadas por atenção e reconhecimento. Indicada ao Oscar pela primeira vez em 2011 pelo seu papel em O Inverno da Alma – um drama sério, mas honesto, nada como Os Miseráveis – é difícil imaginá-la como moça indefesa ou totalmente desprovida de humor. Em O Lado Bom da Vida, Lawrence interpreta Tiffany, uma personagem que é tão agressiva quanto vulnerável, muito mais complexa do que uma prostituta moribunda. Para lidar com o trauma de ter perdido o marido ainda jovem, Tiffany arranja uma série de parceiros sexuais que utiliza e descarta como objetos. Pat (Cooper) acabou de sair da reabilitação após agredir o amante da esposa pela qual continua perdidamente apaixonado. Unidos pela dor e o conhecimento de remédios de tarja preta, começam uma amizade estranha que sugere, é claro, a possibilidade de um novo amor. A grande qualidade do filme é que as doenças dos personagens não são tratadas levianamente como entretenimento esquisitinho como faz Pequena Miss Sunshine, por exemplo – são sim levadas a sério, levando em conta todo o transtorno que causam inclusive aos familiares. Apesar de sua consistência, O Lado Bom da Vida é apenas bom, com boas atuações (a indicação de Melhor Atriz Coadjuvante para Jackie Weaver, que mal aparece, é exagero) e, como As Aventuras de Pi, é digno de uma sessão da tarde.

Zero Dark Thirty/A Hora Mais Escura (estreia prevista para 15/02)

5 indicações

Atriz, Filme, Edição, Edição de Som, Roteiro Original

Eu quis tanto gostar de A Hora Mais Escura, me esforcei tanto. O que pode ser mais emocionante do que a caçada por Osama Bin Laden depois do 11/9? Aparentemente, qualquer coisa. É possível pular quase que toda a primeira hora do filme, de tão entediante e desnecessária. A performance de Jessica Chastain como protótipo de mulher forte que desafia o comando é ora risível, ora irritante. Até parece que o diretor é homem, de tão estereotipada que a personagem ficou – melhor dizendo, tenho certeza de que vários diretores homens mais capazes fariam um trabalho muito melhor. Só o final presta, e só um pouco. Até lá, tudo é clichê. Quarenta minutos antes, a diretora dá todos os sinais possíveis de que determinado personagem vai morrer – e morre mesmo. É como um episódio de Homeland, só que muito (muito!) mais longo, chato e previsível. Sem falar na fotografia pseudo-realista de câmera na mão de um senhor com Parkinson. Que desperdício. Os críticos americanos só estão elogiando pelo o que o filme representa – um final justo para o episódio de 11/9 – mas não pelo o que ele de fato é: uma bobagem chata. Só é permitido falar mal se for pelas cenas de tortura (que nem são tão graves assim), mas a verdade é que A Hora Mais Escura é o Crash – No Limite do ano.

9 comentários em “Oscar 2013 – Parte 2

  1. O comentário que você fez sobre o tigre foi exatamente igual ao meu quando saí do filme. A única coisa consistente em “Life of Pi” é o tigre.

  2. *Este comentário não é relativo ao post da Ieda, mas sim ao blog como um todo: em plena renúncia do papa, a Dicta se cala. Sei que estamos no feriadão, mas é muito ruim não ter uma opinião do blog sobre este assunto ímpar… abs.

  3. Caro PH,

    A Dicta&Contradicta não tem opinião oficial em nenhum assunto — com exceção da declaração de princípios do IFE, que a edita. E isso inclui o fato de não ser uma revista confessional ou partidária de nenhuma ideologia. Opiniões do corpo editorial se encontram na seção “Editorial” de cada um dos números impressos. Ademais, o site não possui, via de regra, voz editorial. Assim, se nenhum dos colunistas fixos ou ocasionais tiver algo a dizer sobre o assunto (caso em que teríamos uma opinião pessoal, e não da revista), não haverá nada publicado.

    De qualquer modo agradeço, como colunista e co-editor do site, a sua preocupação.

    Um abraço,
    Julio Lemos

  4. Ieda, acho que *Zero Dark Thirty* tem pelo menos um mérito que você deixou de lado. Sim, o filme foi feito em menos de um ano, recorre a alguns clichês, não é nem documentário, nem “drama”, mas mesmo assim consegue criar uma tensão do início ao fim, ao mesmo tempo que retrata bem os acontecimentos, lembrando o que afirmou Panetta. Não sei quantos filmes há na história que estejam na categoria de romance histórico hiperrealista. Kathryn Bigelow e sua equipe reconstruíram o compound de Osama na Jordânia (se não me engano), de maneira muito similar ao que se sabe que era o compound histórico no Paquistão, que foi destruído (sobrando apenas algumas imagens da ABC). Então é de fato um retrato histórico, embora romantizado; a cena final de ataque é quase em tempo real (dura algo como 27 minutos, enquanto a original se deu em 45). De novo, é o mais próximo que teremos de documento histórico audiovisual, mesmo que virtual. Quanto à personagem, acho que tem seu lugar. (Filo-)conservadores, das mais variadas cores, gostam de não entender a luta pelos direitos civis, inclusive os femininos. Até praticamente ontem mulheres não podiam servir em campo. Há mulheres capabilíssimas, que estão na zona de guerra e que tinham uma proibição besta, que as fazia desiguais. Então mesmo que a construção da figura que move o filme seja um tanto cor de rosa, há lá seu lugar. Achei curioso que em certa cena (se não me engano) o desktop dela aparece por cerca de um segundo com a imagem de uma outra mulher. Esse é um tema não desenvolvido no filme e que teria lá seu interesse dado o seu caráter durão. Mas tergiverso.

    Quanto a *Silver Linings Playbook*, que é um dramalhão um tanto indie, acho que é preciso reconhecer que está um pouquinho acima da média “sessão da tarde”. Ou quantas vezes se vê a redenção do personagem masculino malucão, stalker, e “p*ssy”? [Asterisco porque o sistema de comentários censurou.] É claro que no fim das contas ele é salvo por alguém que queria um pouco de romance em sua vida, Jennifer Lawrence (que em entrevista ao Conan se assumiu também um tanto maluca e contra futebol americano), visto que seu marido morto não queria ir ao concurso de dança com ela, etc. Não sei, não vou desenvolver o ponto, porque talvez eu esteja errado em considerar o filme fora da curva, misturando realismo manicomial a romantismo histriônico, com falatório sem parar de um monte de lunáticos, que, no final, fazem as coisas darem certo. É um tanto ingênuo. De uma ingenuidade romântica típica dos filmes de Capra, que torce e enche de nojinho e náusea o estômago dos que estão acima disso.

    É isso. Se quiser, sinta-se à vontade para desconstruir meu comentário.

    Um abraço!

  5. O que aconteceu com os seus textos tradicionalmente publicados aqui às sextas-feiras? Por que parou, parou por quê?

    Por favor, publique um texto sobre o filme “Além das Montanhas”!

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