Problemas dos grandes livros

Ainda sobre o ensino superior, vejam este artigo de Patrick Deneen: Why the great books aren’t the answer. Uma possível alternativa ao modelo técnico, compartimentalizado e reducionista das faculdades é o currículo baseado nos “great books”: os grandes livros do cânone ocidental. O problema, segundo o autor, é que um cânone tão díspare (que inclui Platão, Tomás de Aquino, Marx e Nietzsche) apenas reforçaria o relativismo e o subjetivismo da cultura universitária, com cada jovem escolhendo arbitrariamente aquele “pensador” com que mais se identifica. A perspectiva de cada universidade escolher uma abordagem para apresentar as obras também não lhe agrada muito, pois isso preservaria o relativismo, só que agora no nível institucional e não mais individual.

A crítica tem seu sentido. Simplesmente jogar um monte de livros tão contrários entre si sobre um estudante pode sim produzir um relativismo ou ceticismo nele; especialmente se a leitura seguir a ordem cronológica, dada a premissa implícita de que o que vem depois é sempre superior. Ao contrário do que imagina Deneen, contudo, a mente do universitário não é matéria inerte, e muitos são capazes de pensar por si próprios e, portanto, tirar frutos da leitura mesmo sem a supervisão da titia na sala de aula. Fica parecendo que, para o autor, o único jeito de escapar do relativismo é impor, a nível nacional (ou mundial?), uma abordagem católica tradicional a todas as faculdades. O que, a bem da verdade, apenas substituiria o relativismo institucional por um voluntarismo autocrático do poder soberano.

Não lhe ocorre que diversidade de opiniões não significa relativismo, que, aliás, caracteriza-se antes pela uniformidade do “tudo vale”, e não pela divergência de opiniões reais. Ele também não atenta para o fato de que idéias contrárias têm muito a ganhar com a existência de pensamentos alternativos. A dialética é meio de se aproximar cada vez mais da verdade, que não se encontra totalmente nessa ou naquela escola.

2 comentários em “Problemas dos grandes livros

  1. Pingback: Tweets that mention Problemas dos grandes livros | Dicta & Contradicta -- Topsy.com

  2. Presado Joel,
    Muio apreciei a crítica ao reducionismo, Achei muit engraçada a solução pretensamente relativista, porque os autores são excludentes. E quando se fala em dialética, já se sabe o grupo que pertence – o mesmo reducionista, porque a dialética é cartesiana par excelence, e seu pioneiro assim fundou a Academia: de um lado, os letrados, poetas, artistas, e, na suposição do primata, os mais ligados a devaneios ao Demiúrgo. E do outro, os matemáticos. Platão foi filósofo e matematico. Tomas escapuliu um pouco, graças ao tempero aristotélico. Nietzsche acho que nunca viu um número. E Marx tudo formulou por estatísticas. Portanto, ficaria engraçado um grupo apresentar as folhas em linguagem matemática aos filósofos, e esses enfiarem uma biblioteca de milhares de volumes para os matemáticos entenderem o mais trivial.
    A única maneira de tornar o ensino efetivo e abrangente, sem ser segmentado, compartimentalizado, é ensinar os postulados básicos da física, para servirem de base aos diversos segmentos, frutos do tronco primrdial.
    Muito grato.

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado Campos obrigatórios são marcados *

Você pode usar estas tags e atributos de HTML: <a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <s> <strike> <strong>