Há algum tempo John Gray fez uma observação importante: não se deve confundir conservadorismo político com fundamentalismo religioso. O brasileiro não é naturalmente conservador, mas um religious freak. Vamos alcançar Uganda.
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Há algum tempo John Gray fez uma observação importante: não se deve confundir conservadorismo político com fundamentalismo religioso. O brasileiro não é naturalmente conservador, mas um religious freak. Vamos alcançar Uganda.
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É exatamente o contrário, o brasileiro é naturalmente conservador. Sempre que nosso povo se pronunciou sobre algo nunca foi aderindo aos delírios da esquerda ou do liberalismo.
E a comparação com Uganda é ridícula.
Talvez o brasileiro médio seja naturalmente fundamentalista e conservador. Idiota duas vezes.
A comparação com Uganda é exata no gráfico. Mas talvez seja mais ilustrativo observar que nosso nível de histeria religiosa é o de uma teocracia islâmica.
“Fundamentalista”, o brasileiro médio? muito boa. O brasileiro médio e sabidamente sincrético, confundindo anjo da guarda com santo de candomblé. Este post acho que é o mais tolo que já li no site da Dicta que, infelizmente, como disse outro dia um amigo, só mostra a cada intervensão do Thiago e do Julio que de fato acabou. O post é tolo não por ser anti-religioso, que isso não ê tolice, mas por ser gratuitamente ofensivo – ofensivo para com aqueles que todos sabem, seguem sendo religiosos e oportunamente ativos no IFE.
Este post está para uma discussão intelectual como a pichação de um muro está para um mural d’OsGêmeos. Pois é evidente que a pesquisa lida com duas categorias distintas que são confundidas pelo Julio deliberadamente. Então, acreditar que Deus é essencial para a moral iguala o sujeito a um religious freak? Haja silogismo, Batman. A relação com o conservadorismo, então, guarda na melhor das hipótese elipses de parágrafos inteiros.
É tão óbvio que dá vergonha escrever, mas há muitas outras instâncias subentendidas em uma pergunta como essa. A Itália é um dos países mais católicos do mundo e claro, o registro estatístico de sua resposta à pergunta é completamente diferente do Brasil – cuja cultura geral, aliás, pode dar muito poucas lições de moral, e por isso mesmo, a luz da própria pesquisa entre brasileiros, deveria ser entendido como um país profundamente ateu (o que nada tem a ver, necessariamente, com ser ou não ser religioso – conheço quem professe religiões profundamente atéias).
Bom, particularmente acho que há muito falta seriedade nas discussões desta página. Com postagens como essa, acho que definitivamente ela deixa de merecer constar entre meus itens de leitura.
Leandro, espanta-me a sua confusão. Você tirou muitas conclusões de quase nenhuma afirmação. Será que é o Leandro que eu conheço? Veja o seguinte:
(1) Não se trata de um texto. Trata-se de um gráfico que sumariza uma pesquisa e de três linhas escritas abaixo dele.
(2) Nessas três linhas, eu digo o óbvio — algo que nunca vi ninguém contestar –: que a proporção 13-87 é próxima à proporção 11-89, e que acreditar que é impossível ser honesto sem acreditar em algum tipo de deus é uma forma de loucura religiosa. Em (4) abaixo, eu explico o que não expliquei nas três linhas: o que entendo por fundamentalismo. Afinal, não escrevi um texto, não argumentei, e não “fiz um ponto”. Na minha opinião, trata-se de uma obviedade.
(3) A Itália é o melhor contra-exemplo: lá, pouquíssimas pessoas acreditam que é impossível ser honesto sem acreditar em Deus. A maioria dos italianos é formada por católicos. Logo, os católicos (majoritariamente liberais, do ponto de vista teológico) não se encaixam nessa definição de ‘fundamentalismo’.
(4) “Fundamentalismo religioso” é um termo fluido. Em sentido estrito, é um movimento protestante dos sécs. XIX e XX contra a teologia liberal, e que tem como principal ponto a literalidade da Bíblia. Em sentido amplo, inclui o islamismo e certas vertentes do judaísmo e do catolicismo (do ponto de vista sociológico). Um elemento comum a todo tipo de fundamentalismo é a ideia de que Deus é o fundamento absoluto da moral e a rejeição, portanto, de uma moral natural. Consequência imediata é que é impossível a alguém ser honesto se não crê em Deus. Essa é a crença de 87% dos brasileiros; e é por esse motivo que eu disse que o fundamentalismo predominava nessas terras: apesar do sincretismo que você muito bem notou. Mas isso só faz sentido usando-se a acepção fluida da palavra.
(5) Leia o Euthyphro de Platão. O ponto dele é que os deuses amam determinado objeto porque ele é bom em si mesmo (honestum, na tradição latina), e não o contrário. Ou seja, não é verdade que algo é bom porque os deuses o amam, independentemente da natureza mesma do objeto. O ‘fundamentalista’ crê que algo é bom porque Deus assim o quis; essa tradição é algo tardia na escolástica, e você a encontrará em Duns Scoto e em Ockham; contemporaneamente, na Teoria do Comando Divino, que é a formulação filosófica do fundamentalismo moral. A sua popularidade nos EUA é enorme.
Não te parece estranho que, no Brasil, — e mais uma vez, de acordo com a pesquisa –, uma maioria esmagadora acredite que os que não crêem em Deus (ou em alguma divindade) são desonestos necessariamente? Não lhe parece uma loucura? A mim me parece. E não creio que seja sequer concebível pensar o contrário, embora esteja aberto a ser convencido nesse sentido (conquanto nunca tenha pensado assim). Essa posição me parecia ainda mais herética e esquizofrênica quando, pessoalmente, julgava o teísmo digno de crédito.
Quanto a ser ofensivo, lembre-se dessa declaração de Roger Scruton, um conservador: “But, you know, you only live once. Why not offend as many people as possible?” Bem, eu não concordo 100% com essa frase. Mas chacoalhar um pouco as certezas do público conservador* — na minha opinião o pior que tem aparecido no Brasil nos últimos anos — é sempre um serviço de utilidade pública.
* Esse público tem mudado muito. Tanto que este ‘post ofensivo’ está entre os mais compartilhados na história do site.
Julio,
Não questionando os resultados da pesquisa, mas o método, você não acha que a escolha entre duas sentenças (1 – It is not necessary to believe in God in order to be moral and have good values ou 2 – It is necessary to believe in God in order to be moral and have good values), como a que mais se aproximaria da opinião do entrevistado, seria insuficiente para se concluir que este aspecto sociológico do brasileiro é determinante para seu fundamentalismo?
De outra forma, e de acordo com a mesma pesquisa, não poder-se-ia dizer que “só pobre acredita em Deus”?
Paulo, eu não saberia dizer. Eu creio que é suficiente. Agora, eu concedo o seguinte: brasileiro é pouco consequente do ponto de vista lógico. Nós não vemos problema algum em dizer “é preciso acreditar em Deus para ser honesto” e depois dizer: “ah, o cara é ateu, mas é gente boa” e acabar concluindo, na prática: “o cara é honesto, afinal de contas”. Isso é muito típico! Assim, minha conclusão seria tomar o resultado ‘com um grão de sal’. Nosso fundamentalismo é temperado e contraditório.
Sobre a questão da renda, li outra matéria nesse sentido. E, sim, em geral quanto mais rico é o país, mais ateísmo você encontra. E quanto mais pobre, mais fundamentalismo. Mas há exceções: a dos EUA se explica, talvez, pelo grande predomínio de evangélicos e protestantes, que costumam ser muito mais severos nesse tema do que os católicos (ao menos do que os católicos de outros países, como na Itália).
O meu questionamento foi exatamente neste ponto: que ideia de moralidade tem o brasileiro? Já encontrei muitas pessoas que tem aquela ideia: “ele fez isto porque não tem Deus no coração” etc etc etc. Assim, isto parece ser um obstáculo epistemológico (como o diz Bachelard) de generalizar uma abstração “não trabalhada” ou mesmo um reducionismo funcional de categorias (é moral, logo é “de Deus” ou vice-versa), afinal, acho que moralidade deve servir para alguma coisa, e não deve servir como “ideia”.
Não existe expressão melhor para definir a religiosidade do brasileiro do que “religious freaks”, pelo menos da maneira como eu entendi. O brasileiro, em geral, acredita em tudo e em nada ao mesmo tempo. Muitos não frequentam qualquer tipo de religião, mas dizem acreditar em “alguma força maior”, que nunca sabem definir direito o que é, talvez por vergonha de se assumirem ateus, o que ainda é um grande estigma social. Somente em alguns círculos muito restritos o ateísmo é aceito (cientistas, alguns artistas, acadêmicos da área “social” e descolados em geral), mas consegue ser mais irritante do que os fundamentalistas mais ferrenhos.
Em resumo, somos mesmo um bando de freaks.