De olhos bem fechados

 

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Um das opiniões mais lamentáveis do nosso zeitgeist é a crença idiota de que a China pode ser civilizada simplesmente porque é um “país em franca expansão econômica”, como se isso fosse garantia de que lá pode se respirar um pouco de liberdade.

Qualquer um com dois dedos de testa sabe que isso não é verdade – e Guy Sorman escreveu um texto no City Journal relatando o que realmente acontece na China.

Anotem estes três nomes: Wei Jingsheng, Hu Jia, and Liu Xiaobo. O primeiro está exilado nos Estados Unidos depois de ser expulso por defender o retorno da democracia na China. O segundo está preso em Pequim porque denunciou como a burocracia se omitiu em relação aos casos de AIDS no país. E o terceiro também está preso e, como seu motivo foi justamente a defesa da abertura da Internet e da criação de leis na China, resolveram deixá-lo incomunicável durante os seus onze anos de encarceramento, sem poder falar com um advogado ou sequer escrever para a sua esposa.

E olha que o aspecto econômico não está tão bom como parece. Como explica Sorman:

The new China seduces us with the Olympic Games in Beijing and with “Expo 2010,” a world’s fair currently taking place in Shanghai. But when we look behind the stage curtain, we see a nation divided in two. There are the rich, who consist of Communist bureaucrats and military brass. And then there are the ordinary people, who show themselves to be well-informed and ready to rebel against the Party and its clients. Peasants rise up to overthrow local potentates; workers demand decent salaries; migrants, who work in factories or building construction, refuse to be driven back to their villages (where there is no work) at the whim of the Party; some courageous journalists denounce corrupt officials; Taoists, Buddhists, and Christians organize in groups to pray or to offer charitable services; university scholars call for democracy, or at least decency, from leaders, and for social equity. Between these two social classes there is, to be sure, a hesitant new middle class, but inflation is wearing it down and a real estate bubble will, sooner or later, bring it to ruin.

Uma maravilha, não é mesmo?

E enquanto isso, na nossa América Latrina, Hugo Chávez, o bufão da Venezuela, cada vez mais explícito com suas conexões cubanas, mandou prender Alejandro Peña Esclusa, presidente da Unoamérica, a única entidade civil que resolveu ter a coragem de ir contra os mandos e os desmandos chavistas. Em uma história digna de relatório da KGB, acusam Peña Esclusa de terrorismo ao descobrirem, dentro de sua casa, explosivos que seriam usados para uma bomba; como acredito que um terrorista jamais esconderia seus artefatos de maneira tão displicente, só há uma única possibilidade para tal fato: a de que Esclusa não é e nunca foi um terrorista e que isso não passa de uma tremenda armação.

O problema é que, tanto no caso da China como no da Venezuela, a mídia e a opinião pública ficaram de olhos bem fechados. Não querem ver o que realmente acontece debaixo de seus narizes. É uma omissão que ninguém sabe se é proposital ou um dos sintomas da loucura coletiva. Se for uma mistura de ambos, só posso dizer que isso não é um bom prognóstico para nós, especialmente após as eleições de Outubro, seja lá quem for vencê-las.

Edmund Burke dizia que a única coisa necessária para o triunfo do mal é que os bons não façam nada. Não tenham dúvidas de que o mundo se encontra exatamente nessa situação.

9 comentários em “De olhos bem fechados

  1. Pois é, caro Martim, está mais do que na hora de nós acordarmos, limparmos o sangue e a poeira e voltarmos para o campo de batalha.

    E carregar no peito o bom e velho grito: “Viva la muerte!” Confesso que nessas horas inspira.

    Que os bons se levantem! E para isso, precisam se unir. O inimigo virtualiza todas as diferenças entre suas linhas, enquanto os defensores da pátria perene dos valores perdem-se em picuinhas infinitamente condicionadas.

    Dias difíceis esses nossos!

    Mas, como diria um tio meu, OREMOS e OBREMOS. Ainda bem que já há quem obre, como os amigos desta nobre revista!

    Parabéns pela coragem de sempre. E que o sucesso só dê forças para o verdadeiro projeto.

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  3. Martim,

    Para mais detalhes sobre a prisão de Esclusa, recomendo a leitura do Notalatina. A esposa dele, em entrevista, disse que 13 os policiais invadiram a casa sem nenhuma autorização judicial e acharam a tal bomba – veja só se não tem cheiro de armação, – no quarto da filha pequena do casal. Como eram muitos policiais devassando a casa ao mesmo tempo, a esposa não teve como seguir de perto a busca de cada um deles, o que tornou fácil uma armação.

  4. Só lembrando que essa situação ficará grave no Brasil, tendente às situações chinesa e venezuelana, no caso de vitória de um dos candidatos, Dilma.
    É preciso dar nomes aos bois, ao maus, sejam lá como eles se apresentam.
    Ou por acaso há algum tipo de posicionamento parecido a isso por parte de todos os outros candidatos à presidente?
    A situação da Receita Federal, com o vazamento por todos os lados do sigilo fiscal de um membro do partido da oposição é claro! sigilo só haverá aos que vazarem a informação, aos que receberam a informação.. ao proprietário e único legítimo detentor da proteção do sigilo sobrará somente a culpa por ter sido exposto.
    Lamento que a mentalidade brasileira do deixa disso, da malemolencia condescendente tenha nos deixado chegar à essa situação.
    Ou alguém imagina que o mal surgirá de capa preta, chifre nas testas e olhos fumegantes, surgindo no meio de uma explosão de fumaça e raios?
    O problema já existe e já está devidamente espraiado pela administração.
    Falta a coragem para apontar esses desvios e chama-los pelo nome que tem.
    Dilma! PT! Lula! etc.

  5. Ao amigo Pablo do comentário das 6:21. Dar nomes aos bois, até tem gente que dê. O problema é outro, o problema é que não um mísero órgão de enfrentamento desse monstro que é o Imbecil Coletivo, o partido, a mão oculta, etc; enfim, nada que enfrente essas pessoas de verdade na esfera pública. A parte mais importante, que é a de formação, é muito promissora, mas temo que os frutos sejam ceifados prematuramente. Acho que a essa altura todos nós podemos ver que a vitória da Dilma representa o fechamento da vida comum dos brasileiros através da chantagem social dos “muvimento sossiau”. Quede um Instituto São Tomás Morus como o que existe nos EUA para defender as pessoas do governo no tocante à liberdade religiosa, fundamental para garantir Homeschooling? Quede o amor mínimo que seja ao próximo, uma vez que aqui não gostar do governo é frescura e elitismo odiosos?
    Houve muita fraqueza. Tudo isso poderia ter sido impedido se a geração anterior tivesse cumprido minimamente os deveres da inteligência e da honra. Poderia ter sido parado na justiça. Poderia ter sido parado em várias tribunas. Mas não, acovardaram-se. Aí o monstro chegou, gostou, cresceu e agora está olhando para nós e lambendo os beiços.

  6. Bem colocado o texto referente às liberdades democráticas não desenvolvidas em outros países…
    Mas se olharmos para o nosso lado, veremos que aqui também elas não existem senão aparentemente, pois ser obrigado a votar, a mídia manipulista, a força do poder da elite dominante há cinco séculos em nosso país, a ignorância campeando solta, colocam o Brasil no contexto indireto da opressão que não é muito diferente daqueles países que ostensivamente praticam a ditadura. |Pior ditadura é aquela que não é visível…

  7. Ou eu muito me engano, ou a frase portuguesa é “dois dedos de testa”, não “dois dedos na testa”.
    Seja como for, cumprimentos pela revista.

  8. Não tenho como dedicar muito de meu tempo a este comentário, assim já peço desculpas de antemão pelo seu tímido desenvolvimento. Eu concordo com a crítica, porém vejo um tanto imprecisa a expressão “civilizada”. Nela podem estar encerradas uma série de visões, como aquela que apontava para um estágio mais evoluído de civilização, expressão do pensamento normativo e moralista novecentista. Penso que a experiência humana ao longo dos milênios demonstra que sempre se está na situação de um equilíbrio precário e compete aos homens bons, aos que agem com prudência, descartarem os maniqueísmos e transcenderem as classificações moralistas pela compreensão racional das coisas. Assim, logo se percerbe que o bom, o mau e o feio anda muito misturado nesse mundo. Não se combate irracionalismo com irracionalismo; convém que também não deixemos de prestar atenção nisso.

    Abraços!

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