Pílulas sem qualquer humor

Apenas um bobo de extrema notoriedade poderia receber “Pina” de Wim Wenders como um “spa mental”. Primeiro porque praticamente toda a obra coreográfica da artista é uma tentativa de extrapolar a cisão cartesiana mente-corpo; e é neste sentido, apenas neste, que suas coreografias não foram feitas “para pensar” – são feitas para ser respondidas com todo nosso aparato sensível.

Além disso, é claro, pois o filme rende uma coleção de homenagens pungentes. E é, em si, uma obra tecnicamente primorosa. Isso deveria assegurar para qualquer pessoa saudável uma série de nós de análise e interpretação. Mas quando a cabeça é oca, a arte é “pura sensação” escapista.

Neste millieu não é estranho que para alguns até a Bíblia se torne entretenimento…

“Pina” não é, em hipótese alguma, um lugar para relaxar e “recuperar as baterias”.

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Não há qualquer possibilidade de entender a política americana em uma análise que compare os conservadores da direita americana aos Talibans. E mais interessante é que um analista da cultura possa dizer tamanha sandice sem encontrar qualquer contraponto a respeito, que seja na internet.

A analogia que Contardo Calligaris faz da ala radical do partido Republicano com os fundamentalistas islâmicos é mutatis mutandi como aquela que associa Barack Obama a Adolph Hitler (aqui) ou Joseph Stalin (duvida? clique aqui).

Coisa estulta a reduzir toda complexidade do mundo ao raio de visão da própria miopia. No caso de Calligaris, um agravante pois sequer novidade há; a demonização dos republicanos em nossas paragens é anterior mesmo a George W. Bush, o primeiro.

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A nomeação de Marcelo Araújo para a Secretaria de Cultura do estado de São Paulo e os boatos que Danilo Santos de Miranda esteja levando a sério a hipótese de sua nomeação como Ministro do setor são evidentemente notícias auspiciosas.

A despeito da competência dos atuais e pretéritos designados para o papel, o fato incontestável é que são demonstração de que, no tênue equilíbrio necessário para cumprimento do cargo, entre corporativismo de classe, poder político e gestão técnica, finalmente uma chance será dada a esta última.

Evidentemente, a coisa é assim não de má vontade mas por conta do equilíbrio entre tais forças, exigência do cargo. No caso, a competência executiva de Marcelo e Danilo é incontestável. Ambos contam ainda com a vantagem de serem apoiados pela classe. O perigo para ambos será queimarem os próprios trabalhos neste terreno pantanoso que é a gestão pública da cultura – onde o trânsito político costuma mesmo ser, até o momento, o fiel para bem e para mal.

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De quarta a domingo duas peças do Festival de Curitiba chegam à São Paulo, no Auditório Ibirapuera. Destaque para “Licht + Licht” de Caetano Vilela sobre a obra de Goethe.

“Licht” recebeu críticas espalhafatosas e parece ter sido a melhor coisa do Festival, espetáculo impactante e inteligentemente bem-humorado. A ver se a referência a Goethe é apenas um chamariz para a turma highbrow.

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