A ausência de fé de Alexis de Tocqueville

Em seu novo ensaio publicado na New Yorker, James Wood resolveu escrever sobre ninguém menos que Alexis de Tocqueville, o patrono dos conservadores moderados, por assim dizer. Wood tem lá os seus problemas – ele implica em demasiado com as referências espirituais dos escritores que analisa, talvez um reflexo do seu problema pessoal com a fé, já desenvolvido em livros anteriores – mas ninguém pode dizer que o homem lança umas hipóteses instigantes. Em seu texto sobre Tocqueville, desenvolve a premissa de que o célebre A Democracia na América é um livro sobre o advento de uma nova fé que veio para substituir a velha – no caso, o igualitarismo democrático em lugar do bom e velho Cristianismo – como se isso fosse, na verdade, um reflexo das lutas constantes do nosso querido Alexis com sua própria ausência de fé:

Society, Tocqueville felt, needs religion’s emphasis on the afterlife. God guarantees the authority of morals (goodness comes from God), and, more generally, religion leads democratic man away from the narcissism and materialism endemic to non-aristocratic societies. Yet how does one continue to renew religious belief in an age of radical doubt? Tocqueville’s solution has a whiff of characteristic French cynicism, even of hypocrisy. It is basically what Voltaire called croyance utile, “useful belief.” Religion doesn’t have to be true, Tocqueville thought, but it is very important that people profess it. So, he writes, whenever religion has put down deep roots in a society, one must “guard against shaking it; but rather preserve it carefully as the most precious inheritance from aristocratic centuries; do not seek to tear men away from their old religious opinions to substitute new ones.” Materialism seems to have been a fearful abyss for Tocqueville, teeming with the devils of unbelief, nihilism, and disorder. In a pungent sentence, he avers that, if a democratic people had to choose between metempsychosis and materialism, he would rather have citizens believe that their souls will be reborn in the bodies of pigs than that they themselves are just matter.

É uma reflexão ousada o suficiente para quem acha que conservadorismo é apenas um bando de jovens carolas que escutam música erudita – e, claro, se você acha isso, aguarde a próxima Dicta, que, olhem só, terá um ensaio muito especial sobre Tocqueville.

3 comentários em “A ausência de fé de Alexis de Tocqueville

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  2. Mas que bela notícia. Já estava na hora de a Dicta falar de Tocqueville.

    Também gosto bastante do Wood, mas além desse problema de procurar espiritualidade nos autores, ele prega que apenas um tipo de literatura é válida, a de certo realismo psicológico, e parece achar todo o resto descartável.

  3. Quem concorda plenamente com o Tocqueville de Wood é o saudoso Irving Kristol (1920-2009) – o primeiro “neocon”, bastante diferente de seus herdeiros em alguns aspectos.

    A visão de Kristol acerca da utilidade cívica da religião parece tomar algo dos ensinamentos de Leo Strauss (que admirava Tocqueville – vide What is Political Philosophy). Resta saber até que ponto – e com que grau de distorção.

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