A First Things publicou uma divertidíssima coletânea de comentários maldosos — e, arrisco dizer, alguns muito certeiros — a passagens de C. S. Lewis em The Abolition of Man. Um exerto final:
The bastard actually means that the more man knows, the more he is bound by reality, the more he has to comply with an “A is A” existence of absolute identity and causality – and that is what he regards as “surrender” to nature, or as nature’s “power over man.” (!) What he objects to is the power of reality. Science shrinks the realm of his whim. (!!) When he speaks of value judgements, he means values set by whim – and he knows that there is no place for that in nature, i.e. in reality. (The abysmal scum!)
Não é sem razão que os leitores de C. S. Lewis sentem-se, muitas vezes, diante de um simplório. Convido os que não o conhecem bem a ler, todavia, os seus longos e caprichados escritos sobre literatura. O seu talento de filólogo e escritor — muitas vezes escondido atrás do ingênuo desprezo à ciência (que hoje fazem ainda menos sentido que à época em que escreveu) e do louvor a uma “sabedoria” vaga e descascada — há de servir para alguma coisa.
Achei a interpretação da Ayn Rand mais simplória que sempre que leio o Lewis, na verdade.
“Não é sem razão que os leitores de C. S. Lewis sentem-se, muitas vezes, diante de um simplório.”
Poxa, rs. Quando o leio tenho sempre a impressão de já ter lido aquilo antes. É como se ele fosse bom para dizer em outras palavras – e, certamente, em melhor estilo – o que já fora dito. Mas penso que está muito longe de Chesterton (sei que Julio o acha superestimado), que geralmente é lido e admirado pelos mesmos leitores e admiradores de Lewis.
Não li todos os seus escritos sobre literatura, mas o The Allegory of Love é fraco; é praticamente um resumo meio inconsistente de tudo que já havia sido escrito pelos franceses sobre literatura medieval; e ele ainda toma ideias de O Outono da Idade Média, de Huizinga, por exemplo, sem citá-lo nenhuma vez (pelo menos não o encontrei na edição que tenho).
O ponto forte do argumento de Rand é sua estrutura enfática. Lewis costumava afirmar que escrevia para crianças. Simplório sempre foi, mas existe algo mais simplório que as frases amorosas de Rearden? rs
“C.S. Lewis e Chesterton são as duas Tias Cotinhas do Cristianismo” (Dante Gabriel Rosseti).
Mas Ayn Rand cheira a Constantino, e portanto, temos preconceito de dar atenção a seus comentários.
O Dante Gabriel Rossetti que morreu em 1882? 😉
Que uma mulher dedique seu tempo a elaborar insultos para escrever nas margens de um livro revela a sua profunda insanidade patológica. Na verdade isso depõe a favor da obra de Lewis, pois essa histeria é tipicamente provocada quando o insano é confrontado com a realidade.
Sempre soube-se que Rand era uma psicopata, uma marxista ao inverso. Recomendo o capítulo sobre Ayn Rand do livro “10 Books Every Conservative Must Read”, de Benjamin Wiker, para desfazer qualquer dúvida. Rand fez miserável a vida de todos a seu redor, agredindo e ameaçando todos que se opunham a seus caprichos egoístas.
Me pergunto se essa insanidade toda da mulher tem algo a ver com o culto à ciência praticado por ela. A ciência está cada vez mais desacreditada, pois a cada dia que passa saem mais notícias sobre as enormes fraudes científicas, que hoje, sabe-se, compõe a maior parte da dita produção acadêmica.
Nem mesmo o discurso da ciência como meio de melhorar nossas vidas vale mais, visto que historiadores profissionais da tecnologia o desconstruiram como mero instrumento de propaganda e hoje colocam a tecnologia como campo independente da ciência, que não depende e nunca dependeu da ciência para evoluir.
Andre, quem já não fez comentários marginais desse tipo? A única coisa que prova é que, como diz a manchete, Rand não gostava de Lewis. São dois ad hominem (o seu e o de Rand), que se anulam. Deixo aos defensores dela, se quiserem, a apologia. Eu só concordo que Lewis era ingênuo — talvez menos que os seus leitores.
Sobre os historiadores da tecnologia, você tem razão (embora o juízo segundo o qual a tecnologia existe sem ciência não resista aos fatos por muito tempo). Quanto às notícias de fraude, semelhantes aos escândalos da Igreja, só fica provado com isso que, desde que a humanidade existe, a fraude aparece até nos lugares mais nobres, dos santuários aos laboratórios.
Ayn Rand não entendeu C.S. Lewis. Ele se referia ao avanço da ciência aplicada fora do “Tao”, ou seja, à redução da inovação tecnológica ao cumprimento dos caprichos, gostos e desejos imediatos dos “manipuladores e inovadores”. Todas as invenções, todos os “avanços” e “progressos”, não representam o poder do homem sobre a natureza, mas o poder de alguns homens sobre o resto dos homens com a natureza como instrumento. A concentração de poder daí decorrente, cuja realidade os tempos atuais cansam de confirmar, culminará por fim na abolição do homem, sua escravização total.
Rand estaria certa se o avanço da ciência se reduzisse ao mero acúmulo de conhecimento, mas o contexto maior da coisa — o desprezo contemporâneo do “Tao” — lhe escapou por completo, tornando sua interpretação de Lewis um tanto ingênua.
Quero apenas felicitar aos amigos que tão bem apresentaram seus pontos de vista em relação a obra de C.S. Lewis e outros escritores e me ajudaram muito a pensar melhor. Grato a todos!