Philip Roth e o Pequeno Príncipe

Passou batido no Brasil, vi pouca gente compartilhando em redes sociais, mas saiu uma entrevista do Philip Roth no New York Times neste domingo (2), que ele deu a um jornal sueco – o gancho era suas traduções para a Suécia (que pode ser lida aqui), que é muito boa. É uma longa conversa que merece ser lida do começo ao fim, onde Roth compara o exame que fez de suas obras, relendo os 31 livros que escreveu, ao que o boxeador Joe Louis, um ídolo pessoal, disse ao se aposentar em dez palavras: I did the best I could with what I had.

Sobre os detratores que acusam sua obra de certa misoginia, o autor americano esclarece que basta uma leitura atenta de qualquer um de seus livros para que seja feita a distinção entre um crítico estúpido e outro razoável. E que, como escritor, é preciso ser mais e mais tolerante com esse tipo de reação histérica. Talvez o momento mais intenso da entrevista, no entanto, tenha sido o que ele comenta da sua dificuldade para escrever.

Cito: “A cada manhã, por cinquenta anos, eu encarava a próxima página em branco indefeso e despreparado”. Considera que, mais do que talento, foi obstinação que salvou a sua vida. Agora que parou de escrever, sente-se como um pássaro que saiu da gaiola, cujo horror de ficar preso dentro dela por tanto tempo perdeu seu encanto. Sente-se aliviado, algo que se aproxima do sublime, por não ter mais muito com o que se preocupar a não ser a morte. Palavras de Philip Roth.

ps: sobre nunca ter recebido o Nobel, brinca que se tivesse chamado “Portnoy’s Complaint” de “The Orgasm Under Rapacious Capitalism” talvez tivesse alguma chance.

______________________________

Visitei a Morgan Library nesta semana para duas exposições em especial. A primeira é a do Pequeno Príncipe, que foca principalmente nos rascunhos e nos manuscritos originais da obra que, muitos não sabem, mas foi escrita aqui em Nova York durante os dois anos que Saint-Exupéry passou longe dos horrores da Segunda Guerra na Europa (junto com “Pilote de Guerre” e “Lettre à un Otage”). Partiu daqui com o livro que o tornaria um dos autores mais conhecidos de todos os tempos e para um destino trágico: desaparecia no Mediterrâneo em julho de 1944, após ter se juntado às forças aéreas francesas no norte da África.

thelittleprince_morgan1

Além dos manuscritos, há também o bracelete que vestia quando visto pela última vez em terra, com o endereço de seus editores em Nova York, Reynal & Hitchcock, que publicaram “O Pequeno Príncipe” em francês e inglês pela primeira vez um ano antes do desaparecimento de Saint-Exupéry. Este bracelete foi encontrado próxima à costa de Marseille, não faz muito tempo, por pescadores locais.

A exposição traz detalhes interessantes de como foi o processo de concepção da história, do descarte de personagens e acontecimentos, até exclusões de longos parágrafos e frases que foram reescritas à exaustão até ficarem do jeito que o autor queria. Por exemplo, a célebre frase “l’essentiel est invisible pour les yeux” passou por várias versões, como “l’essentiel est impossible”, “c’est impossible voir l’essentiel avec leux yeux” e mais de dez outros caminhos. Até chegar a forma final como a conhecemos, repetimos e trivializamos hoje.

A outra exposição é sobre xilogravura e o seu papel na produção moderna de livros. O que começou como uma reação às máquinas tecnológicas de impressão acabou servindo de modelo a ser seguido para a formatação de livros como objetos, uma ideia modernista que se estende aos dias de hoje. São livros e páginas que correspondem ao período de 1890 a 1935, um dos mais revolucionários em termos de impressão.

 

8

 

________________________

 

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado Campos obrigatórios são marcados *

Você pode usar estas tags e atributos de HTML: <a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <s> <strike> <strong>