Michael Dummett (1925-2011)

Entre os homens de grande fama no século XX está um subconjunto não menos ilustre, mas muito discreto, que nós costumamos chamar de filósofos (embora fiquemos desconfiados quando se antecipam e atribuem a si mesmos esse nome). Alguns deles defenderam teorias grandiosas, capazes de explicar tudo — e por isso inspiraram uma fidelidade quase religiosa e foram, e ainda são, encarados como profetas. Estes são os indiscretos entre os discretos; o que nos leva a um subconjunto menor: o dos filósofos pouco solenes e dados ao trabalho duro. Os dois grupos — o das cigarras mágicas e o das formigas engenheiras — praticamente se ignoram mutuamente.

Mesmo que não me agradem os grupos, penso que Michael Dummett, falecido no último 17 de dezembro aos 86 anos, pertencia ao segundo. Apesar de ser seguramente um dos filósofos mais importantes da segunda metade, ou ao menos do último quarto, do século XX, poucos leitores no Brasil o conheciam. (Uma nota antipática, mas que se aplica a mim mesmo: não os posso culpar por se interessar mais pelas cigarras mágicas. É muito mais divertido ouvir falar de ‘duplos angélicos’, paranóia na pós-modernidade e conspirações do que dissecar a teoria do significado de Frege ou as bases lógicas da metafísica.)

Dummett formou-se em Oxford (em colleges que incluem o Christ Church e o All Souls), tendo lá sido professor da cadeira Wykeham Professor de Lógica até 1992, quando se aposentou; mas também deu aulas em Harvard, Princeton, Berkeley e Stanford. Recebeu o título de Sir em 1999 e vários prêmios por sua obra e sua forte atuação contra a discriminação racial. Devemos a ele a melhor exposição e crítica sobre a obra de Gottlob Frege; e também a sensação de alívio diante do fato de que nem todo filósofo analítico precisa ser formalmente graduado em matemática — já que ele escreveu Frege: Philosophy of Mathematics (1991) e dava baile em muito graduado. Também era um expert em jogos de cartas e na história do Tarot (veja-se o seu A History of Games Played with the Tarot Pack, 2004, em conjunto com John McLeod), e excelente prosador, autor de um Grammar and Style (1993). Era católico praticante — defensor da inteligibilidade da Eucaristia — e nada heterodoxo. O resto está nas biografias.

Na mesma linha que vai de Aristóteles a Wittgenstein, acreditava que a filosofia pode, e deve, se dedicar aos problemas realmente importantes: a natureza do ser, Deus, o livre arbítrio, as ‘leis lógicas’ do pensamento, os limites do conhecimento. Também sustentava que, para se meter no mare magnum da filosofia, o pensador não pode dispensar, sob hipótese alguma, o instrumental — esse inimigo mortal das cigarras mágicas — lógico-matemático, que revolucionou a filosofia no século XX, capaz sobretudo de impedir o cara de brincar de Let’s Jump to Conclusions. E se é verdade que não exigia que todo e qualquer filósofo devesse estar a par de todos os resultados da lógica e das ciências duras, estava persuadido, como diz um amigo, de que “Aristóteles, hoje, estaria grudado nos laboratórios”.

Ele pensava que a filosofia era muito mais difícil do que parecia; e que nesse âmbito muitos filósofos — inclusive os maiores entre eles — erraram, não ao pensar que alguns problemas poderiam ser solucionados, mas que isso pudesse ser feito rapidamente. A filosofia avançou muito pouco, mas avançou. Mas será que um dia poderemos dar ganho de causa, por exemplo, ao realismo ou ao anti-realismo?

Um mapeamento geral das bases da metafísica está em seu livro ‘autoral’ mais importante: The Logical Basis of Metaphysics, que é uma versão expandida das suas William James Lectures, dadas em 1976 em Harvard.  Nele, Dummett procura mostrar que a grande tarefa da filosofia é construir adequadamente uma teoria do significado (meaning). Para ele, trata-se da base de todos os problemas filosóficos — porque afinal de contas, embora a realidade possa estar diante de nós independentemente do pensamento, só podemos ‘falar’ dela por meio da linguagem (não necessariamente escrita ou oral). A escolha entre os vários sistemas lógicos depende de uma posição fundamental no terreno da teoria do significado; e daí surgirá uma avaliação do realismo, sua principal preocupação.

Se quiser conhecer a obra do filósofo, o interessado pode começar por este livro.

Num tempo de desistência e de pirotecnia (dois opostos que parecem frutos de uma mesma árvore), Dummett é dos que acreditavam que a filosofia, sim, é a busca por respostas — pela verdade — e nada mais.

46 comentários em “Michael Dummett (1925-2011)

  1. Estranho sua menção a Wittgenstein no sentido posto no texto. Você diz:

    “Na mesma linha que vai de Aristóteles a Wittgenstein, acreditava que a filosofia pode, e deve, se dedicar aos problemas realmente importantes: a natureza do ser, Deus, o livre arbítrio, as ‘leis lógicas’ do pensamento, os limites do conhecimento.”

    Dos problemas que você cita, parece-me que somente os dois últimos são propriamente filosóficos, segundo Wittgenstein. “A natureza do ser”, Deus e, talvez (não estou bem certo), o livre-arbítrio são questões verdadeiramente importantes para ele, mas não são questões que possam ser esclarecidas filosoficamente.

    No mais, excelente post.

  2. Saudações, prezado Juarêz S., a filosofia se ocupa de tudo o que inerente ao humano,principalmente no que diz respeito às explicações de sua existência e dos conflitos inerentes à vida.Ela é a tentativa do ser humano compreender o mundo e a si mesmo, buscando trazer luz à consciência, cuja iluminação, desde há muito tempo, é a meta primordial.
    Sem mais, respeitosamente.

  3. Juarêz, sua observação é pertinente, mas não se sustenta de todo. Se é certo que Wittgenstein se preocupava com essas duas questões — Deus e a moral –, tendia, especialmente na época do Tractatus, a considerá-las impassíveis de tratamento filosófico. Na sua obra posterior, todavia, embora eu não acredite piamente em um ‘segundo Wittgenstein’, ele parecia mais aberto a elas, e chegou a as enfrentar diretamente, o que apóia o meu trecho. Entre os temas que Wittgenstein enfrentou diretamente estão (i) a natureza da crença em Deus em “Lectures on Religious Beliefs” (em “Lectures and Conversations on Aesthetics, Psychology and Religious Belief” Oxford, 1966); (ii) Deus, a religião e a moral em “A Lecture on Ethics”, Philosophical Review, XLVIII, 1972. Há várias passagens interessantes sobre esses temas, tangencialmente, no próprio Tratactus e nas Investigações Filosóficas, e mesmo nas Observações Filosóficas.

    Um abraço,
    Julio Lemos

  4. Caro Julio,

    Eu pensava justamente em “A Lecture on Ethics” quando te questionei. A minha impressão (a de um leitor não especializado) é a de que Wittgenstein mostra ali justamente que não se pode tratar filosoficamente do tema ético (entendendo filosofia como ele entende, obviamente).

    Observe os trechos (a tradução é irresponsavemente minha): “se um homem pudesse escrever um livro de ética, este livro destruiria, como numa explosão, todos os livros do mundo”; e “A ética, se é alguma coisa, é algo sobrenatural e nossas palavras só expressam fatos”; ou ainda, “Um característico mau uso da nossa linguagem subjace em todas as expressões éticas e religiosas”.

    Parece-me, mas pode ser realmente que eu esteja enganado, que ele está o tempo inteiro mostrando na Conferência que a linguagem científica e filosófica não pode dar conta desses fenômenos “sobrenaturais” (ética e religião): “tudo o que dizemos sobre o absolutamente milagroso segue carecendo de sentido”.

    Falar desses temas seria extrapolar os limites da linguagem descritiva, ir além do mundo e da “linguagem significativas”.

    E, segundo ele, “arremeter contra as paredes de nossa jaula (nossa linguagem) é um ato perfeita e absolutamente desesperançoso”.

    E ainda: “o que diz a ética não adiciona nada, em nenhum sentido, ao nosso conhecimento”.

    Bem, desculpe as muitas citações, mas é um tema que me interessa realmente discutir. É evidente que ética e religião interessam a Wittgenstein, mas acredito que quando ele trata disso é justamente para colocarlos em outro âmbito, talvêz até mais importante do que o filosófico:

    “(A ética) é o testemunho de uma tendência do espírito humano que eu pessoalmente não posso senão respeitar profundamente e por nada do mundo ridicularizar”.

    Um abraço,

  5. Sim, você tem razão. Pensei que não tivesse notícia desses textos. O tratamento de Wittgenstein desses temas é negativo — como na teologia apofântica, numa analogia quase adequada. Mas não deixa de ser uma visão sobre o tema; no fundo, penso que ele tinha consciência de que era impossível fugir desses temas (o que pessoalmente só se foi descobrir com o deciframento dos diários codificados dele).

    Aliás, seus comentários estão entre os melhores que já recebi por aqui. Comente sempre.

    Um abraço,
    J.

    P. S.: Um retrato pós-wittgensteiniano pode ser encontrado no próprio Dummett, no livro citado:

    “How can we tell what is right and what is wrong? Is there any right and wrong, or do we just make it up? Could we know the future or affect the past? Is there a God? And the layman is quite right: if philosophy does not aim at answering such questions, it is worth nothing. Yet he finds most writing by philosophers of the analytical school disconcertingly remote from these concerns. Their writing treats, often with a battery of technical devices, of matters, like the meanings of proper names and the logical form of a sentence ascribing a belief to someone, that apparently have no bearing on the great questions with which philosophy ought to deal. The complaint, though unjustified, is understandable; and there are various causes for the situation that prompts it. One is that analytical philosophy passed, comparatively recently, through a destructive phase; a few, indeed, have not yet emerged from it. During that phase, it appeared as though demolition was the principal legitimate task of philosophy. Now most of us believe once more that philosophy has a constructive task; but, so thoroughly was the demolition accomplished, that the rebuilding is of necessity slow. Secondly, although we no longer regard the traditional questions of philosophy as pseudo-questions to which no meaningful answer can be given, we have not returned to the belief that a priori reasoning can afford us substantive knowledge of fundamental features of the world”. (p. 1).

  6. “embora fiquemos desconfiados quando se antecipam e atribuem a si mesmos esse nome”, “conspirações no seio do Foro de São Paulo”. Parabéns por alfinetar o pseudo filósofo Olavo de Carvalho e procurar colocar cada coisa no seu devido lugar.

  7. Opa, Julio. Muito bom o trecho que você postou.

    Ainda dentro do tema, uma análise que achei bastante interessante desse aspecto na obra de Wittgenstein foi feita por Ernesto Grassi. Se te interessar, posso te enviar a referência por email.

    Um abraço,

  8. Luiz (7), pelo jeito, você não reconheceria um filósofo nem se tropeçasse em um. E ainda vem fazer ironias com o Olavo? Ridículo.

  9. Aguardamos um dia que o IFE lance um curso com a finalidade de abrir a caixa-preta quase esotérica de Wittgenstein, Frege e companhia voltado a leitores acostumados a pirotecinia ensaístico-literária.

  10. Caro V.,

    Pode haver uma direita escapista — que feliz ou infelizmente desconheço –, mas nunca um ‘novo’ perenialismo (justamente porque o perenialismo defende que os temas de investigação são sempre os mesmos, nunca novos), e muito menos uma ‘filosofia lógico-matemática’ (no mundo anglo-saxão se fala em “lógica filosófica”, que é uma disciplina da lógica; e universalmente se fala em lógica matemática, que é a lógica estudada com métodos matemáticos).

    O que deve preocupar qualquer pessoa é a ignorância — começando pela própria.

    Um abraço,
    J.

  11. J, entendo perfeitamente seus apelos ao rigor intelectual e à busca de exatidão dos conceitos e juízos, contidos nos seus recentemente constantes apelos aos “literatos” para que se dediquem a uma disciplina dura como a lógica, a matemática ou a filologia. Sabemos que papel aceita tudo. Ninguém julga ser fácil projetar um acelerador de partículas atômicas, pintar como os grandes pintores figurativos do passado, compor uma sinfonia, ou enfrentar Gary Casparov numa partida de xadrez, mas muitos têm a petulância de ter entendido um livro de Platão ou Kant na segunda leitura ou chegam ao cúmulo de julgar poder facilmente filosofar como Aristóteles ou Edmund Husserl. Talvez em razão de a filosofia ser algo muito etéreo. A lógica e a matemática serviriam para imunizar o “pensador” contra o inspiracionismo automático e a verborragia, evitando os juízos inexatos que enchem o mundo de falsidades que terão conseqüências em cadeia. Mas resta a velha desconfiança de que a dedicação a assuntos altamente formais e abstratos (buscando a verdade só por estes canais, enfatizo) idiotize o estudioso para a “vida real” . Neste sentido acusa-se Wittgenstein de, a despeito de suas habilidades mentais extraordinárias, ter tomado parte de causas absurdas como o stalinismo, sem perceber a perversidade intrínseca do sistema. Ou teria havido algo de virtuoso no stalinismo que os autores conservadores, carentes de lógica e matemática, não tenham entendido? Por derradeiro, para os avessos à lógica e a matemática, não há outros métodos árduos de busca da verdade? Autoflagelação, por exemplo?

  12. Bravo, V.! A verdade é experimentada. Nenhum conhecimento real torna-se menos verdadeiro por não poder ser expresso formalmente. A lógica formal pode destruir mentes afastadas de um mínimo de sinceridade.

  13. Descobri, por conta própria, de onde vem a ideia de que Wittgenstein tomou “parte de causas absurdas como o stalinismo”.

    Vem do livro de Kimberley Cornish, “The Jew of Linz”. Livro que já foi desacreditado pelos biografos do filósofo.

  14. V. e Douglas (no seu caso, para complementar),

    Wittgenstein tinha simpatia pela Rússia e pela causa dos operários, mas nunca abraçou nenhum tipo de socialismo. Aliás, ele o rejeitou em conversas e mesmo por escrito. Isso está nos diários dele; cf. Ray Monk, “The Duty of Genius”, a biografia mais bem documentada do filósofo. Outro erro comum — e grotesco — é associar Wittgenstein ao budismo. Aliás, recentemente uma mesma pessoa conhecida fez as duas associações; o que me provoca vergonha alheia.

    Abraço,
    Julio Lemos

  15. Caro F.,

    Acusar a lógica formal de destruir mentes é o mesmo que acusar a filosofia “sem lógica” de levar *necessariamente* seus praticantes a incorrer em inconsistência. São disciplinas diferentes, que se ajudam e complementam. Nunca representaram um perigo uma para a outra. O que me parece é que o medo de enfrentar a matemática, a falta de talento e a preguiça acabam por se transformar veladamente em argumentos autocomplacentes “contra o formalismo”, que nada têm de crítica substancial. Parece-me mais desculpa para não estudar do que sinceridade e honestidade intelectual.

    Um abraço,
    Julio Lemos

  16. Caro Júlio,

    Me parece que o problema dos raciocínios lógicos não é nem a matemática, nem seus formalismos, mas sim as premissas, que são em número inabarcável, como já dizia Santo Tomás de Aquino: “Nenhum filósofo jamais esgotaria sequer a essência de uma mosca”. Em suma, na filosofia, o verdadeiro problema é saber juntar o que tem a ver e separar o que não tem na realidade concreta. Por exemplo, quando eu digo: A = B; B = C; logo A = C, isso é perfeitamente lógico e coerente, contudo não lhe diz nada sobre coisa alguma na realidade, é um conhecimento meramente formal e esvaziado de qualquer significado. Os tratados de lógica, são todos constituídos deste tipo de conhecimento, donde se conclui que toda lógica é um conhecimento do tipo lúdico e construtivo baseado na estrutura da possibilidade. Admirar um sujeito por suas habilidades matemáticas, é como admirar um campeão mundial de xadrez por sua habilidade em vencer dezenas de competidores simultaneamente, é um mero apreço pela sua técnica. Os verdadeiros filósofos, muito mais que em formalismos, estão interessados na realidade, por isso, ao contrário do que você disse: eu penso que ficar fechados em seu próprio mundo de formalismo e axiomas lógico-matemáticos, isso sim é uma verdadeira desculpa para não estudar a realidade.

    Abs,

    Rafael C. Melo

  17. Caro Rafael,

    Eu lhe sugiro que diga isso ao Alvin Plantinga e ao Saul Kripke, que estão vivos e fazendo filosofia. E por que não reclamar com Aristóteles e seu “Organon”? Por que não fechar o departamento de Filosofia do MIT, de Harvard, de Cambridge e da Universidade de Munique? “Toda lógica é um conhecimento de tipo lúdico”. Sem lógica, toda a filosofia cai por terra. Isso que você falou devia dar cadeia, hein?

    Vou soltar uma da Academia de Platão: “Não entre quem não for geômetra (‘ageoometreetos meedeis eisitoo‘)”. (Cf. o que diz o comentador cristão às ‘Categorias’ de Aristóteles, Filoponos, em Comment. in Arist. Graeca, XVIII, parte 1, ed. A. Busse, Berlin, 1900, p. 118, 18). Sem ressentimentos.

    Um abraço,
    Julio Lemos

  18. Caro Júlio,

    Vejo que você não teve contra argumentos para as coisas que afirmei, no lugar preferiu escorar-se nas autoridades que preza; o que é algo, no mínimo, curioso para alguém que defenda tanto o raciocínio criterioso e correto das ciências duras – São Tomas de Aquino dizia que “os argumentos de autoridade são os mais fracos”.

    Abs,

    Rafael C. Melo

  19. Caro Rafael,

    Ali há argumentos, mas nenhum de autoridade; são na verdade históricos e genéticos, porque a filosofia ocidental, que nasceu mais propriamente com Platão e Aristóteles, sempre teve insofismável apreço pela lógica. Mas o mais forte é o seguinte: todo argumento e toda discussão faz uso da lógica; chamá-la de atividade lúdica é dizer que os seus próprios argumentos, de resto inexistentes, se apoiam no jogo e na recreação matemática. (Além disso, um argumento extra-filosófico, mas de base: o programa que sustenta este site e esta caixa de comentários foi inteiramente criado com algoritmos, lógica de primeira ordem e proposicional, além de computabilidade, tema que se deve a filósofos e matemáticos como Tarski, Emil Post e Turing).

    No seu comentário não há, por outro lado, argumento, e o ônus da prova por chamar a lógica de atividade lúdica (o maior absurdo que já ouvi em muito tempo) é seu.

    Um abraço,
    Julio Lemos

  20. Caro Júlio,

    Nenhum dos seus argumentos contraria o que disse anteriormente. Além disso, ao citar Platão e Aristóteles deveria concordar que, embora tenham apreço pela lógica, o método de argumentação que utilizam em seus escritos não é lógico, e sim dialético – num processo que parte da doxa (opiniões acerca do assunto) e, através da confrontação de hipóteses chega até a episteme (conhecimento probabilístico do assunto) -, alias, é exatamente este o processo utilizado por todas as ciências no mundo. Sem isso não há ciência, pelo simples fato de que: se nada foi percebido, nada pode ser argumentado. Quando você diz que a lógica é a base e fundamento de toda a filosofia, você está criando um fantasma, pois cortou a primeira parte do processo, ignorando que antes de criar um argumento a pessoa deve perceber algo, do contrário, o argumento é apenas um símbolo auto-explicativo funcionando em circuito fechado, totalmente esvaziada de conteúdo semântico. Como uma regra de jogo: onde você postula os termos, as relações entre eles, e forma assim um domínio fechado independente da realidade, isto que chamo de conhecimento lúdico (Eu estudo Ciência da Computação). Alias, não entendo a sua dificuldade em aceitar isso, pois qualquer pessoa que joga um jogo de baralho, xadrez, pocker percebe a lógica operando alí do modo que demonstrei.

    Abs,

    Rafael C. Melo

  21. Não adianta apagar minhas mensagens, você sabe que está errado, e por isso apaga elas desesperadamente.

    Você, Julio, e todo esse grupinho da sua geração, não têm seriedade e nem coragem para exercer a vida intelectual. Ou você toma consciencia e faz mais verdadeira essa dedicação, ou esquece tudo isso e continua se corrompendo.

    Um ex-amigo dos tempos de universidade.

  22. “Lúdico” em todos os dicionários significa “relativo ao jogo, divertimento ou brinquedo”.

    Não entendi a parte em que diz “o argumento é apenas um símbolo auto-explicativo funcionando em circuito fechado, totalmente esvaziada de conteúdo semântico”. Pode esclarecer?

    Obrigado,
    Lucas Dias

  23. Guilherme, acabei de checar o arquivo de mensagens deletadas, e não consta nenhuma sua. Aliás, nenhuma que tenha sido escrita nesta discussão por qualquer comentador. Ou seja, nada seu foi deletado.

    Deixaremos este seu comentário passar, apesar do baixíssimo nível, só porque, para bravatas como a sua, publicá-las é refutá-las. Contudo, mensagens futuras que não elevem o tom serão, essas sim, apagadas. Não venha depois reclamar.

  24. Caro Lucas,

    Na faculdade eu tive uma cadeira chamada “Lógica de Programação”, que consistia em decorar uma série de formalismos e derivar alguns axiomas de outros axiomas. Digite “lógica proposicional” no google e você vai entender do que estou falando. A cadeira consistia em resolver problemas do tipo, deduza o axioma da direita a partir do axioma da esquerda:

    1) P, Q, P ^ Q → R ├ R
    2) P ^ (Q ^ R) ├ R
    3) P → (Q → R), P ^ Q ├ R
    4) ├ (P → Q) ↔ (¬Q → ¬P)
    5) P v U, P → R, Q → R ├ R
    6) A → (M → C) ├ (A → M) → (A → C)

    Chegando ao final do sementre, se você me pergunta-se: “Que tipo de conhecimento científico-empírico você aprendeu?” Eu diria: “Nenhum, foi pura masturbação mental, um mero joguinho mental para passar o tempo”. Acho que com isso, você consegue entender o que quero dizer com atividade lúdica.

    Abs,

    Rafael C. Melo

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  26. Acompanhem o seguinte argumento:

    Aranhas são insetos.
    Insetos têm oito patas.
    Logo, aranhas têm oito patas.

    O argumento é válido (pois a conclusão segue-se validamente das premissas), a conclusão é verdadeira (materialmente), mas é obtida a partir de premissas falsas. As variações são muitas, desde argumentos válidos contendo premissas verdadeiras que atingem conclusões também verdadeiras, até argumentos inválidos com premissas falsas que atingem conclusões falsas, passando pelos válidos com premissas falsas e conclusões verdadeiras, etc.

    Caro Rafael C. Melo, o sr. J. Lemos sabe sim o que significa atribuir ludicidade à lógica. O que falta a ele (e à filosofia analítica) é perceber que teu reproche a ela versa sobre o mundo real, é sair do joguinho ginasiano de premissas, encadeamentos e conclusões e dirigir o olhar à realidade do mundo, à verdade que ele encerra.

    Claro, ginasiana não é a lógica em si, mas o uso que adolescentes (incluindo os que o serão para sempre) fazem dela. Não preenchem seu esqueleto com a carne do mundo concreto.

  27. Não deveria ser permitida a publicação de comentários de baixo nível, com ofensas pessoais. Vamos deixar esse tipo de coisa para o site do pessoal que gosta de fazer tempestade em copo d’água com polêmicas vazias.

  28. Olha, tirando um exagerinho ali até assinalado pelo Joel, nao vi nada de “baixo nível”. Até agora, o que estamos presenciando é o sr. Lemos parando de responder as várias refutaçoes que recebeu.

    Estamos no aguardo!

  29. “Toda a ciência da matemática, todo o domínio da filosofia, da física ou da química mais elevadas, não poderiam jamais predizer, ou saber, que a união de dois átomos de hidrogênio gasoso com um átomo gasoso de oxigênio resultaria em uma substância nova e qualitativamente superaditiva – a água líquida. O completo entendimento desse único fenômeno físico-químico deveria ser o suficiente para impedir o desenvolvimento da filosofia materialista e da cosmologia mecanicista.

    A análise técnica não revela o que uma pessoa, ou coisa pode fazer. Por exemplo: a água é usada efetivamente para extinguir o fogo. Que a água irá apagar o fogo é um fato da experiência cotidiana, mas nenhuma análise da água poderia jamais ser feita, para revelar tal propriedade. A análise determina que a água é composta de hidrogênio e oxigênio; um estudo posterior desses elementos apenas revela que o oxigênio é o real sustentador da combustão e que o hidrogênio irá por si mesmo queimar livremente.”

  30. Dizer que o método de Aristóteles era dialético, que partia das opiniões até a episteme, falar de probabilístico e tal, que Wittgenstein estava vitimado por paralaxe cognitiva e do reino abstrato formal não via o horror do regime stalinista. Tudo isso junto forma um admirável compêndio de teses olaveticas, as olavetes são fáceis de se perceber seja pelo cheiro ou por agirem em bando.

  31. Caros,

    Se forem ler o meu texto, verão que não adoto nenhuma tese no que diz respeito à filosofia. Meu ponto marginal — porque o principal era o necrológio de Dummett — era a diferença entre pirotecnia e trabalho intelectual sério. Nunca sustentei o logicismo; quem já leu outras coisas que escrevi sabe que — se for possível atribuir-me um rótulo — sou, assim como muitos aqui, aristotélico (quando o assunto é teologia e acabo por deixar escapar alguma opinião, sou tomista). Nunca fui um grande fã de Wittgenstein, mas lhe admiro a acuidade e o zelo filosófico; ele está no grupo dos que, preocupados com a verdade (como no frontispício a uma edição das ‘Philosophische Bemerkungen”: ‘SDG: soli Deo gloria’), sequer sabem, na sua inocência, o que é uma polêmica que não seja estritamente filosófica; numa discussão com os positivistas lógicos, deixou bem claro que as noções ‘inominadas’, desvinculadas da palavra escrita, eram as noções realmente importantes. Wittgenstein foi o primeiro a reagir contra uma escola supostamente criada por ele (o positivismo lógico do Círculo de Viena) — o caso nos permite perceber, aliás, como é comum as pessoas imputarem teses filosóficas às outras sem o mínimo cuidado.

    Minha visão sobre a filosofia analítica é cheia de mixed feelings, mas em geral positiva. Demorei muito a conseguir entender, por exemplo, os artigos do casal G.E.M. Anscombe e Peter Geach (que são uma espécie de epítome da filosofia ‘católica’ analítica, não fosse absurdo o nome) que um professor da Universidade de Navarra me indicou num café da manhã. Mas houve um momento em que percebi que as análises lógicas — que nunca exigem mais que um estar a par dos resultados básicos da lógica matemática no século XX, que deixam no chinelo o de resto interessantíssimo trabalhos dos lógicos medievais, que formularam algumas ‘leis lógicas’ e souberam aliar a lógica à metafísica, como viriam a fazer mais tarde alguns bons filósofos analíticos (cf. Kneale, “The Development of Logic”, cap. IV; um tema de estudo meu, a logicalidade, preocupou lógicos medievais, que chamavam de syncategoremata os termos lógicos, procurando isolá-los dos não-lógicos); e resolver um bom número de exercícios de lógica proposicional e teoria da quantificação, cobertos em um ou dois semestres — davam ao filósofo um poder de síntese e uma acuidade inegáveis, além de os treinar para não deixar passar nenhum raciocínio menos rigoroso. É uma filosofia dura, difícil, pronta a botar medo nos leigos; mas com o tempo se torna familiar, e suas virtudes aparecem com muita clareza. Tanto que o seu estilo foi adotado por gente tão díspar quanto William Lane Craig, meu apologeta favorito (e há até uma ‘teologia analítica’ sendo criada); alguns neo-ateus tontos; filósofos da ciência do MIT; professores de filosofia japoneses e africanos. Isso tudo é muito diferente de ser um lógico; lógicos são criaturas de outro departamento, consultados, é verdade, mas nunca absorvidos substancialmente, embora isso seja conveniente para os mais talentosos. Eles são tão importantes para a filosofia quanto os arqueólogos o são para os historiadores, embora a analogia seja pobre. Há história geral sem arqueologia; sem filologia; sem diplomática e sem epigrafia; mas pode o historiador se dar ao luxo de dizer que os arqueólogos e filólogos são crianças ocupadas com recreação erudita? Novamente, a analogia não é exata; é só ilustrativa.

    Isso é só parte do meu ponto de fundo. Espero que os mais cuidadosos evitem o atribuir a mim teses que não defendo, preconceitos que não tenho. No mais, não tenho nenhum interesse em polêmica, xingamentos, ataques pessoais e pirotecnia.

    Abraços a todos,
    J.

  32. Comentário ao post do Rodrigo:
    “Dizer que o método de Aristóteles era dialético”, “teses olaveticas” (sic)…
    Bem, o Olavo não diz que a conclusão (sobre o método aristotélico) é dele, mas de Eric Weil (e dá a referência: V. Éric Weil, “La Place de la Logique dans la Pensée Aristotélicienne”, em Éssais et Conférences, t. I, Philosophie, Paris, Vrin, 1991, pp. 43-80).
    Portanto, se a citação é verdadeira, a tese não é “olavética”.

  33. Caro Luiz,

    Não ando na USP com o Prof. Marco Zingano, embora o conheça. Aliás, não piso na USP há tempos. Não tenho nenhuma imagem na academia e, além disso, nunca me associei ao Olavo (de modo que não seria necessário, na sua suposição, me ‘desassociar’). Cada um responde pela sua vida intelectual.

    Saudações,
    J.

  34. Mas Julio, o problema todo não é por que você comparou o Olavo com a cigarra, que ele não faz um trabalho filosófico técnico, sério e com rigor lógico. E fica perdendo tempo com cortinas de fumaça, pirotecnias e com conspirações do foro de São Paulo?

  35. Caro Enzo,

    Lembra-se da expressão “vestir a carapuça”? Ela é usada quando se critica determinado procedimento geral e alguém se levanta, indignado, dizendo: “Ei, você está sugerindo que *eu* me comporto assim?” Se a pessoa fica tão incomodada a ponto de levantar a mão, é porque tem alguma ‘issue’ a resolver. Ou talvez só queira brigar a esmo, seguindo os impulsos do ‘pecado original’, que a todos nos contaminou. Ou talvez o crítico é que se tenha equivocado; todos temos direito a tentar. Se acha que a crítica vale para ela, que reflita. Se não vale, tanto melhor! Cada um que tire suas conclusões. É o que faço quando me sinto ofendido.

    Um abraço,
    J.

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