George Méliès, mágico do cinema

Até 16 de setembro, o Museu da Imagem e do Som (Avenida Europa, 158, Jardim Europa, São Paulo) exibirá “George Méliès, mágico do cinema”. Dividida em seis seções que remontam a trajetória do artista, a exposição produzida pela Cinemateca Francesa e inédita no Brasil também conta com uma instalação em que o público terá a chance de criar seus próprios filmes em stop motion com cenários baseados nas obras de Méliès. Além dos objetos originais expostos, haverá projeções de onze de seus filmes em algumas das paredes do Museu. Já sua obra-prima, Viagem à Lua (1902), será exibida dentro de uma nave espacial inspirada no filme. Em 15 julho, o Cinematographo, programa mensal do MIS que apresenta projeção de filmes mudos sonorizados por músicos ao vivo, ganha uma edição especial. Será exibida uma seleção de filmes de Méliès à maneira como eram apresentados no Teatro Robert-Houdin do início do século XX, com acompanhamento ao vivo dos bisnetos do artista. Marie-Hélène Lehérissey irá narrar os filmes e Lawrence Lehérissey fará o acompanhamento ao piano com músicas de sua autoria.

Meu texto de estreia no blog da Dicta&Contradicta foi a resenha de Hugo, filme de Martin Scorsese sobre o garoto órfão que, buscando desvendar o mistério de um pequeno robô encontrado pelo seu pai pouco antes de morrer, acaba descobrindo a obra do cineasta George Méliès. Disse, na época – e ainda penso o mesmo – que Hugo era um dos melhores filmes sobre o cinema, pois não trata somente de sua origem, mas também de sua essência artística.

Antes de Méliès, o advento do cinematógrafo nada mais era do que uma nova tecnologia cujo principal intuito era o de documentar o cotidiano. O horror, contudo, que a locomotiva dos Irmãos Auguste e Louis Lumière provocou na plateia em 1895 (há um belo paralelo da cena em Hugo que, concebido em 3D por Scorsese, renova a ilusão do trem que parece extrapolar o limite físico da tela e do mundo real) mostrou a Méliès o potencial narrativo do cinema. Foi o mágico que transformou a tecnologia em uma arte capaz de retratar os nossos sonhos e provocar ainda outros. O cinema como arte, desde então, é necessariamente fantasia, ficção. Se um filme não consegue provocar horror ou encantamento, ele se torna meramente um registro histórico. O cinema nasceu, portanto, como uma máquina de sonhos – por um lado, unifica os sonhos daqueles que criam os filmes e, por outro, multiplica os do espectador.

Cada arte tem a sua particularidade; a da literatura é a tentativa da descrição mais exata possível de sentimentos que são indizíveis, inexplicáveis. Aquilo que leva páginas para ser retratado pode ser resumido em segundos de uma imagem. A vivência da leitura de um livro é algo que ocorre como que em tempo real – as coisas precisam ser explicadas, leva tempo para tecer uma impressão, por mais simples que ela seja. Os filmes, assim como os sonhos, ocorrem em um tempo próprio que não é o real. A imagem, objeto final das palavras, suscita de uma só vez meses, anos, vidas inteiras. O cinema tem o poder da síntese: com ele viajamos na velocidade da luz, fazemos parte, enfim, da paisagem lunar e acabamos por descobrir o universo dos anseios humanos.

3 comentários em “George Méliès, mágico do cinema

  1. Texto excelente, do qual destaco: “A imagem,objeto final das palavras, suscita de uma só vez (…) vidas inteiras.O cinema tem o poder da síntese: com ele viajamos na velocidade da luz (…) parte da paisagem lunar e acabamos por descobrir o universo dos anseios humanos”.

  2. É engraçado perceber como a história do cinema poderia ter seguido por um outro caminho se não fosse a intervenção de verdadeiros visionários como George Méliès. Acredito que o cinema não é apenas um palco para entretenimento e reflexão, mas acomoda todas as outras modalidades de arte, condensando-as, introjetando-as e tornando-se um produto que fascina e acalenta sentimentos ambivalentes em seus espectadores.

  3. É verdade, Luiz. Dizendo de forma bem simples, gosto de cinema porque é a mistura de literatura, teatro, arte, fotografia, música, design, moda, arquitetura…

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